Com o título “Pequenas e impróprias lições de Direito Constitucional para quem não tem pressa”, eis o artigo do cientista político e ex-reitor Paulo Elpídio de Menezes Neto. Confira:
O recurso à inelegibilidade, a que recorrem agora alguns estados americanos, sinaliza a fragilidade que apresentam, hoje, alguns conceitos e pressupostos democráticos que serviram de base e fundamento aos arquétipos republicanos, construídos pelos “federalists” fundadores.
Nos Estados Unidos, estrutura que uniu e amarrou a “América”, revela uma surpreendente novidade: a eleição, como processo político essencial à governabilidade, cedeu espaço a medidas judiciais que interrompem o rito e o fluxo constitucional.
Não havendo como evitar as ameaças que sombreiam a democracia, mediante o voto, e vivendo o país mergulhado em uma obscura polarização ideológica, restou o expediente legal, porém pouco democrático, de impedir candidaturas. Uma espécie de “cassação” prévia e cauterizadora do assédio de ondas autoritárias e radicais que multiplicam-se país afora.
O Brasil, como soe acontecer em circunstâncias especiais, antecipou-se ao partido democrata americano e instituiu, com pioneirismo retumbante, o “impedimento” de candidaturas a eleições presidenciais.
Impediu Bolsonaro de candidatar-se, embora houvesse conferido exceção clemente à Dilma, impedida por mau comportamento gerencial, porém perdoada de uma cassação iminente, embora constitucionalmente amparada e justificada.
O ponto a considerar aqui, está em outra curva distante dessa linha ascendente de tropeços constitucionais.
Melhor apontar para a ruptura dos processos construtivos da máquina democrática, como se poderá observar.
A impossibilidade de impedir candidaturas de vezo autoritário, tangidas pelo viés totalitário de parte crescente do eleitorado, a guarda pretoriana dos poderes republicanos frustra o cidadão-eleitor e impede que o seu voto seja dado a quem está sob suspeita de impulsos totalitários.
O Brasil, ao tempo do Império, dispunha de um mecanismo constitucional — o poder “moderador” — que prevenia ou abortava impulsos abusivos da ordem constituída, exceção atribuída às forças armadas. Por insegurança ou o que valha tomar-se como argumento, esses preceitos ainda perduram dissimuladamente na Constituição. Mas já não contam de fato como recurso de intervenção para preservação dos princípios democráticos.
Ao Pretório responsável por todas as decisões reservou-se o poder de intervir, rever, decidir e reformar todo e qualquer dispositivo legal, práticas usuais e consensuais, a aplicação pertinente de princípios hermenêuticos e o que vier tornar-se suspeito perante os olhares críticos e premonitórios de monocratas cujas decisões escapam aos limites de qualquer autoridade.
Suspeito que a a isto, a estes cabedais jurídicos, caibam, por fim, as categorias que acudiam a Geisel e, mais recentemente, a Lula de uma democracia “relativa”, inspirada nos valores da “cità”, pela consulta direta aos cidadãos, como pretende, aliás, Milei…
Paulo Elpídio de Menezes Neto é cientista político, professor e escritor, além de ex-reitor da UFC