A primeira tese de doutorado no Brasil dedicada exclusivamente ao capacete Elmo foi defendida no último dia 27 de agosto, pela pesquisadora Betina Santos Tomaz, dentro do Programa de Pós-Graduação em Ciências Médicas da Universidade Federal do Ceará. Integrante do Laboratório da Respiração (RespLab/UFC), a agora doutora investigou a adição de vazamentos expiratórios intencionais durante o uso do capacete para reduzir um problema cuja ocorrência é frequente: a reinalação de dióxido de carbono (CO₂).
“O capacete funciona como uma espécie de câmara em torno da cabeça e permite administrar oxigênio, pressões e volumes de ar para auxiliar pessoas com dificuldade respiratória, sem a necessidade de intubação. A reinalação acontece quando parte do ar já exalado pelo paciente, rico em CO₂, que deveria ser eliminado do corpo, permanece preso dentro do capacete e acaba sendo inalado novamente. É como respirar de volta um ar ‘usado’”, explica Betina.
A reinalação pode trazer consequências indesejadas ao paciente, desde sonolência, dor de cabeça, confusão mental até agravamento da insuficiência respiratória, caso o CO₂ se acumule no organismo. “Para enfrentar esse problema, testamos uma estratégia simples: criar uma saída controlada de ar no capacete, de modo que o ar exalado não fique acumulado. Esse ‘escape’ favorece a renovação do ar dentro da interface, garantindo que o paciente respire um ar mais limpo, com menos CO₂”, resume a pesquisadora.
O estudo foi realizado em voluntários saudáveis, com o capacete Elmo acoplado tanto a ventiladores portáteis (de circuito único) quanto a ventiladores de UTI (de circuito duplo). Parte da pesquisa foi desenvolvida na Universidade do Porto, em Portugal, com bolsa de doutorado sanduíche financiada pela Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Funcap), sob orientação do professor Miguel Ramalho Souto Gonçalves, da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP).
Os resultados mostraram que os vazamentos expiratórios adicionados reduziram significativamente a reinalação de CO₂ em todas as condições avaliadas, chegando quase a eliminar o problema quando usados em ventiladores de UTI. O próximo passo envolve estudos diretamente com pacientes.
Capacte Elmo
Criado no primeiro ano da pandemia de covid-19, em 2020, o capacete Elmo foi usado em pacientes com insuficiência respiratória, ligado diretamente a uma fonte de oxigênio e ar comprimido, diminuindo a necessidade de ventiladores mecânicos e reduzindo em 60% a demanda por internação em leitos de UTI, num contexto de sistemas de saúde sobrecarregados.
De lá para cá o dispositivo foi alvo de diferentes estudos, mas, segundo Betina, sua pesquisa, orientada pelos professores Eanes Delgado Barros Pereira e Marcelo Alcantara Holanda, representa um passo a mais, ao testar o uso do capacete junto a ventiladores mecânicos. “Isso abre novas possibilidades de tratamento e permite que ele seja usado não só em pacientes com convid-19, mas com outras doenças respiratórias”, pontua.
“Até então, nenhum estudo havia avaliado de forma sistemática o impacto da adição de vazamentos expiratórios intencionais na redução da reinalação de dióxido de carbono dentro do capacete Elmo. Esse aspecto é fundamental, porque a reinalação de CO₂ é uma das principais limitações desse tipo de interface. Demonstrar que é possível minimizar ou até eliminar esse problema traz uma nova dimensão para o uso seguro e eficiente com outros ventiladores mecânicos”, reforça a autora.
Apoio internacional
A etapa do trabalho realizada em Portugal ocorreu por meio da seleção do projeto no Edital 08/2023 – Funcap/Internacionalização. Na Universidade do Porto o capacete Elmo foi testado com ventiladores mecânicos de alta performance, incluindo os de UTI de circuito duplo, e teve seu desempenho avaliado em diferentes condições.
“Isso abriu espaço para que o Elmo fosse estudado também em contexto internacional, com possibilidade futura de uso em populações estrangeiras e de construção conjunta de artigos e novos produtos em colaboração com outros centros de pesquisa”, detalha Betina.
“O edital Funcap/Internacionalização amplia a formação dos estudantes, promove a troca de conhecimento e coloca a ciência produzida no Ceará em diálogo com o que há de mais avançado no mundo”, reconhece.
(Agência UFC)