Com o título “Poder civil e a tutela dos militares”, eis artigo de Heitor Férrer, médico e deputado estadual pelo União Brasil. “Agora, no julgamento do ex-presidente Bolsonaro, condenado por tentativa de golpe de Estado, ficou evidente a maturidade do Exército, que não tutelou mais uma ruptura institucional, quando os derrotados alegavam fraude nas urnas, a mesma estratégia de Vargas, guindado por militares a uma ditadura de 15 anos”, expõe o articulista.
Confira:
Fui militar, médico do Exército de 1981 a 1986. Servi no Hospital Militar, em plena ditadura, portanto, me sinto muito à vontade para falar dessa instituição pela qual tenho extremo respeito e onde tanto aprendi. Revi nossa história e a relação dos militares com o poder político no Brasil.
A monarquia, sem entrar no mérito, foi derrubada por militares em 1889. Marechal Deodoro da Fonseca liderou o golpe, tornando-se o primeiro presidente da República. Seu vice, Marechal Floriano Peixoto. Deodoro renunciou em 1891 e Floriano assumiu. Inicia-se a Velha República (1891-1930), marcada pela política do quot;café com leitequot;. São Paulo e Minas Gerais se revezavam no poder.
Em 1930, o presidente Washington Luís, paulista, indicou outro paulista, Júlio Prestes, à presidência, rompendo o acordo com os mineiros. Em resposta, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraíba lançaram Getúlio Vargas à presidência e João Pessoa, vice. Júlio Prestes venceu a eleição. Os derrotados, Vargas e João Pessoa, alegaram fraude nas urnas e a alegativa se espalhou pelo país. Contestaram o mesmo sistema eleitoral que elegeu todos os presidentes anteriores até então. Em meio à crise, João Pessoa foi assassinado por João Dantas num crime de motivação pessoal, mas explorado politicamente.
Militares simpáticos aos derrotados depuseram Washington Luís, prenderam-no e o exilaram, exilando também Júlio Prestes e, no uso da força, deram a presidência a Getúlio Vargas, que se tornou ditador por 15 anos.
Esses militares que o sustentaram em 1930 foram os mesmos que o derrubaram em 1945, no fim da Segunda Guerra Mundial. Foi eleito o general Gaspar Dutra, que derrotou outro militar, o brigadeiro Eduardo Gomes. Getúlio, que alegara ter sido roubado nas urnas em 1930, foi eleito em 1950 por voto direto, presidindo o Brasil até 24 de agosto de 1954, quando, sob crise política, militares forçaram sua renúncia.
Getúlio resistiu, mas suicidou-se na madrugada de 25 de agosto. Assumiu seu vice, Café Filho, que tramou com uma ala do Exército não dar posse a Juscelino Kubitschek, eleito presidente. Outra ala do Exército afastou Café Filho e o general Teixeira Lott garantiu a posse do eleito. Mais uma vez, uma tutela militar.
Em 1961, elege-se Jânio Quadros, que renuncia em seis meses. Seu vice, João Goulart, assume, mas era malvisto pelas Forças Armadas e pelos Estados Unidos. Em 1964, novo golpe militar e uma ditadura que se estendeu por 21 anos.
Agora, no julgamento do ex-presidente Bolsonaro, condenado por tentativa de golpe de Estado, ficou evidente a maturidade do Exército, que não tutelou mais uma ruptura institucional, quando os derrotados alegavam fraude nas urnas, a mesma estratégia de Vargas, guindado por militares a uma ditadura de 15 anos.
*Heitor Férrer
Médico e deputado estadual pelo União Brasil.