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“Precisamos, todos, rejuvenescer”

Tuty Osório é jornalista e escritora

“Brasil brasileiro, desconhecido de seus irmãos, território afora”, aponta a jornalista e publicitária Tuty Osório. Confira:

O hotel está lotado. São Convenções de Vendedores de grandes empresas que atuam no estado. Coisas ligadas ao AGRO. Hoje tem também uma da Nestlé. São de todas as idades, os vendedores. Surpreendente que há equiparação de quantidade de homens e mulheres. O mundo mudou, apesar de tudo. O recorte de cena em Cuiabá, é expressão disso.

São barulhentos, os protagonistas do meu voyerismo matinal. Porém, tão alegres que é impossível incomodarem. Gosto quando chegam ao salão do café da manhã, em revoada, parecendo estudantes de um bando. Sabemos que há muita coisa envolvida, mas não tenho como não ver poesia no modo como riem despreocupadamente, lembrando as travessuras da farra da noite anterior.

Os inimigos do fim salvos pelos guardiões dos excessos, enfiados no UBER sem negociação. Típico de todas as farras, quando se é jovem, com a alma tomada pela eternidade da vida em festa. Certamente tiveram que encarcerar os sonhos na mochila de trabalho, a sucedânea da pasta dos anos 1970, 1980. Ou o voo para as vendas foi o início da concretização de planos.

Não há como saber. Penso nisso, porque uma das violências que mais me incomoda é a desigualdade de chances de sonhar. A divisão entre quem pode permitir-se ao sonho e quem jamais poderá. Sei que quem tem fome tem pressa. Que a dor da fome é a suprema e a inexorável.

Contudo, tendo sido eu, essa jovem farrista, na geração de voz dos Titãs do roque brasileiro, a gente não quer SÓ comida. Gente, gente, gente, não pode querer SÓ comida. Esse SÓ até parece absurdo, mas o alimento é complexo e o primeiro movimento é cultural. O bebê mama porque sua mãe, uma mãe, alguma mãe, está ali, num gesto aprendido de lhe oferecer o seio.

A mãe preparou-se meses para esse momento supremo de alimentação e de início do rito difícil de inclusão e troca. O bebê o desconhecia, a rigor. Adere-lhe por instinto. Sobretudo, por confiança. Mãe e bebê sofrem imensamente para aquele ato de sobrevivência. Que é, também, uma espécie de sonho realizado.

Qual a relação do bebê com esta capital do Centro Oeste onde me encontro? Muitas. Tal qual se simplifica os primeiros meses de vida, como se de um duro desafio de resistência não se tratassem para o estreante humano; também se reduz esta região do país a estereótipos que banalizam as suas identidades.

Grandes plantações de algodão e soja, para o mal e para o bem, dependendo do emissor e do receptor da mensagem. Queimadas devastando o Pantanal e o Cerrado. As patinhas da onça mutiladas pelo fogo que a acuou covardemente – nesta última imagem, já estamos de saída do julgamento padrão.

Transeunte por estas bandas, posso testemunhar os cuiabanos que esperam o transporte coletivo, que atendem nas lojas, prestam serviços ao turismo, cuidam de outros cuiabanos em hospitais e creches. Brasil brasileiro, desconhecido de seus irmãos, território afora.

Chamamos o bebê de Sua Majestade. Rotulamos o Centro Oeste, todo ele, de mero reinante das riquezas do AGRO. Maiores, ambos podem nos mostrar muito mais. É questão de prestar atenção. Muita atenção. E aprender coisas novas. Restaurar os nossos próprios corações.

Tuty Osório é jornalista, publicitária, especialista em pesquisa qualitativa e escritora. Lançou em 2022, QUANDO FEVEREIRO CHEGOU (contos); em 2023, MEMÓRIAS SENTIMENTAIS DE MARIA AGUDA (10 crônicas, um conto e um ponto) e SÔNIA VALÉRIA A CABULOSA (quadrinhos com desenhos de Manu Coelho); todos em ebook, disponíveis, em breve, na PLATAFORMA FORA DE SÉRIE PERCURSOS CULTURAIS

Eliomar de Lima: Sou jornalista (UFC) e radialista nascido em Fortaleza. Trabalhei por 38 anos no jornal O POVO, também na TV Cidade, TV Ceará e TV COM (Hoje TV Diário), além de ter atuado como repórter no O Estado e Tribuna do Ceará. Tenho especialização em Marketing pela UFC e várias comendas como Boticário Ferreira e Antonio Drumond, da Câmara Municipal de Fortaleza; Amigo dos Bombeiros do Ceará; e Amigo da Defensoria Pública do Ceará. Integrei equipe de reportagem premiada Esso pelo caso do Furto ao Banco Central de Fortaleza. Também assinei a Coluna do Aeroporto e a Coluna Vertical do O POVO. Fui ainda repórter da Rádio O POVO/CBN. Atualmente, sou blogueiro (blogdoeliomar.com) e falo diariamente para nove emissoras do Interior do Estado.

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  • Maravilha sua escrita vem de dentro e claro de fora também, não somos só o que vemos, pra mim somos até o que não sabemos ainda, parabéns!

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