Com o título “Quando a compaixão guia a política”, eis artigo de Francisco Caminha, escritor e ex-deputado estadual.
“Que importa que teu barco seja um nada na vastidão do oceano, se à proa vão heróis e marinheiros” (Hino do Estado do Ceará).
Barcos à vela são as mais pacifistas expressões marítimas da pós-modernidade. Navegar movido pelo vento exige paixão, técnica, respeito pela natureza e atenção aos imprevistos. No mar, os velejadores se apoiam mutuamente, numa comunidade fundada no companheirismo e na solidariedade.
Foi com esse espírito que uma flotilha de mais de 40 pequenos barcos zarpou rumo a Gaza. Levavam apenas alimentos e remédios ao povo palestino, vitimado por ações que configuram genocídio.
Sem armas, expuseram-se a riscos, enfrentaram bombas de dissuasão, foram detidos e tratados como terroristas e depois foram libertados.
Entre eles estava a deputada Luizianne Lins, única cearense a integrar a missão. Zarpar foi para ela mais do que gesto político: foi coerência de vida. Havia famílias sem comida, hospitais sem remédio e crianças sem teto.
Como sempre fez, Luizianne escolheu estar ao lado dos mais pobres, alinhando discurso e prática. A dor de Gaza ecoa na dor da periferia de Fortaleza, onde governou com políticas públicas voltadas aos que mais sofrem.
Esse gesto traz à memória outras páginas de bravura cearense. Em 1941, quatro jangadeiros — Manuel Jacaré, Tatá, Jerônimo e Mané Preto — desafiaram o mar vencendo 2.300 Km de distância para chegar ao Rio de Janeiro velejando em uma frágil jangada e denunciar a miséria dos pescadores ao presidente Getúlio Vargas e lutar por Direitos Trabalhistas negados aos pescadores brasileiros.
No século XIX, o pescador e Pratico do Porto do Mucuripe, o Dragão do Mar, Francisco José do Nascimento, recusou-se a embarcar escravizados no porto de Fortaleza, antecipando a abolição no Ceará, quatro anos antes da Lei Áurea.
Assim como eles, Luizianne ousou onde muitos hesitam. Esses atos, vistos como imprudência por uns, revelaram-se sementes de justiça e símbolos de resistência.
Dostoiévski escreveu em O Idiota:
“A compaixão é a lei mais importante e talvez a única da existência de toda a humanidade. ”
O apóstolo Paulo reforça em Romanos 13,10:
“O amor não pratica o mal contra o próximo. Portanto, o amor é o pleno cumprimento da lei. ”
A alma só alcança grandeza quando se abre ao sofrimento alheio. A compaixão é o mais divino dos sentimentos humanos.
O gesto de Luizianne Lins, ao zarpar rumo a Gaza, revela a grandeza de quem não teme os leviatãs da política e permanece fiel à causa dos vulneráveis. É a mesma coragem que moveu jangadeiros e abolicionistas, porque no Ceará o mar nunca foi apenas horizonte — foi caminho de liberdade.
O mar que levou nossos pescadores ao Rio, que fez o Dragão do Mar enfrentar a escravidão e agora levou Luizianne a Gaza, é o mesmo mar da coragem cearense: feito de vento, risco e compaixão.
*Francisco Caminha
Escritor e ex-deputado estadual.
Ver comentários (1)
COMPAIXÃO?
O HAMAS massacra o povo palestino há muito tempo e NUNCA se manifestaram contra esse tratamento cruel e desumano!