Com o título “Reinvenção ética de si”, eis artigo de Zenilce Bruno, psicóloga e sexóloga. Mais um tema interessante em sua abordagem.
Confira:
Com tantas perdas literárias nos últimos tempos, sinto-me instigada a convidar o leitor sensível a sair da posição de mero leitor e fazer comigo outras viagens pelos caminhos da própria construção pessoal e possibilitar emergir em nossos espíritos adormecidos, o sabor de uma coisa que não está alí, algo que submerge dentro de cada um. Outrora chamávamos isto de idealismo, luta, vontade de conhecer para transformar, desejo de revolucionar. “Cada um processa em seu percurso, uma reinvenção de si mesmo”, como disse Jurandir Freire Costa. Reinvenção ética de si, que se compreende no compromisso de pensar de outro modo a vida e a relação com seus semelhantes.
Nos tratados científicos, os temas: vida, saúde e dignidade, têm se tornado sagrado. São temas que exigem atitudes éticas, bioéticas e antropoéticas, onde se discute abertamente que os cientistas e os humanistas têm de se dar as mãos e que o conhecimento, terá de transformar-se também em sabedoria. Nenhuma arrogância intelectual solitária dará conta de construir o bem. A partir de condutas éticas, juntos poderemos construir uma nova estética existencial, onde o ser humano reconhece-se digno e confiável. É quando estamos afetados pelo o que está aí, que primeiro nos transformamos, e depois podemos transformar o mundo. Pegamos caronas nos fatos, e com eles, e através deles, mudamos o que há em nós e em torno de nós.
No momento de grandes comoções o Brasil tem se juntado ao resto do mundo, renascendo das cinzas de nosso exercício de endurecimento, um sentido terno, comovente, vontade de solidariedade, identidade inevitável com aquele outro, não importa em que parte do planeta se encontre. É esse tipo de sentir que nos define como humanos. É essa vontade de solidariedade que nos identifica como humanidade. Mas nem sempre acertamos ser tão solidários, em tons de uma suposta solidariedade, e feito uso do sofrimento do povo. Agonia de uns, esperteza de outros.
Solidariedade não pode combinar com falta de respeito, com interesse próprio. Pelo contrário, solidariedade é desprendimento, é altruísmo, é amor ao outro, é atenção a sua necessidade, é amor ao ser humano. Nada disso se improvisa: solidariedade é um estado de solidez. Solidez de um corpo em que todas as partes se sustentam, de modo que, o que acontece com uma parte acontece também, com a outra ou repercute nela. Isso seria a humanidade “enre-dada”, nós todos afetados uns pelos outros, partilhando e escrevendo a mesma história. A falsa solidariedade é uma violência contra a dignidade e a inteligência do cidadão.
Miltiplas são as tarefas bonitas que a existencia proporciona a quem vive atento às intensidades do seu próprio bem estar no mundo. Cada época da vida, cada estágio vivido, anda sempre grávido de ações e emoções que, se forem percebidas e vividas, fazem-nos emergir do fundo de nós mesmos. Mas, se ao contrário, elas passarem despercebidas em nosso dedilhar cotidiano, a vida perde em intensidade e encantos. Isso nos reporta à necessidade de repensarmos, nós adultos, os caminhos que estamos construindo para os que virão.
*Zenilce Bruno
Psicóloga e sexóloga.