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“Renato Portaluppi é a face do ativismo de extrema direita infiltrado no futebol”

Moisés Mendes é jornalista e escritor

“As ameaças do técnico do Grêmio a jornalistas usam a tática clássica do bolsonarismo”, aponta o jornalista Moisés Mendes

Confira:

Tem pouca ou nenhuma relação com as coisas do futebol a ameaça que o técnico do Grêmio dirigiu a jornalistas, na quarta-feira. Mas com certeza há conexão da ameaça com as mais cruéis práticas de facções criminosas e da extrema direita bolsonarista.

Renato Portaluppi disse o seguinte em Belo Horizonte, em entrevista coletiva depois do jogo em que o Grêmio empatou com o Cruzeiro em 1 a 1, a respeito de queixas dele e da direção sobre o que seriam ‘notícias mentirosas’ divulgadas por repórteres que cobrem o clube:

“Se continuarem mentindo, eu vou dar os nomes aos bois. Eu vou atacar. Vou chamar de mentiroso. Vou chamar de covardes, que estão se aproveitando da situação do Grêmio. Vocês também têm família, vocês também têm filhos no colégio, vocês também andam por aí. E o torcedor conhece alguns de vocês. Vocês querem que a gente passe por dificuldades, alguns de vocês vão começar a passar também? Eu não tenho medo de ninguém da imprensa”.

O trecho é reproduzido na íntegra, para que não falem de frases fora do contexto. Esse é o contexto. Um ativista bolsonarista assumido, irritado com jornalistas que não o bajulam, volta a exibir sua condição de ativista e ameaça os filhos dos repórteres.

Nenhuma surpresa. Portaluppi é o intocável de um clube que assumiu suas feições supremacistas, desde o momento em que decidiu transformar o sujeito em mito local. Em julho de 2019, ele disse em entrevista ao falar de Bolsonaro:

“Votei nele. É meu presidente. O Bolsonaro e o Sergio Moro são pessoas do bem que querem o bem do Brasil. Na minha opinião, quem é contra esses caras é contra o crescimento do Brasil”.

Achou-se no direito de julgar: quem não torcesse pelos times do extremismo e do lavajatismo estava contra o Brasil. Em setembro de 2022, em vídeo, reafirmou que votaria de novo em Bolsonaro:

“Não podemos deixar que o Brasil caia no abismo, como os nossos países vizinhos. Então, no próximo domingo, tem que ser 22. Tem que ser Bolsonaro, para que nosso país continue em boas mãos. Deus, pátria e família”.

Dividiu a torcida do Grêmio, mas seguiu em frente, sempre com declarações que, no tom de voz e até no sotaque acariocado, imitavam Bolsonaro. A fala de quarta-feira, que deve ter sido bem acolhida por milicianos, e não por torcedores, tem todos os ingredientes dessa imitação.

Por que tanta desenvoltura? Porque o Grêmio o transformou em estátua. Chegou a mandá-lo embora e a contratar Roger Machado, no final de 2022, mas logo se desfez do hoje técnico do Internacional. Declarações antirracistas de Roger causavam desconforto no clube que mostra poucos negros nas arquibancadas da sua arena.

Esse Grêmio antes aberto às diferenças, que teve a primeira torcida organizada gay do mundo, entre 1977 e 1983, está contaminado pelo bolsonarismo. Sempre sob a liderança de Portaluppi, que retornou no final do mesmo ano em que demitiram Roger, pouco antes da eleição em que Lula derrotou Bolsonaro.

Portaluppi passou a impor todas as suas vontades e a mandar no clube. Queria ser o técnico da Seleção, com o aval de Bolsonaro. Deu tudo errado. Sua performance recente é de fracassos, com um período de exceção de vitórias asseguradas pelo craque uruguaio Luis Suárez em 2023.

O técnico que não estuda nem treina e empurra o time para a segunda divisão é um caso exemplar das figuras e das situações que estão muito além do futebol e das questões clubísticas.

Portaluppi é a expressão da tentativa de sobrevivência da retórica e das ações identificadas com o extremismo bolsonarista em todas as áreas. Há Portaluppis por toda parte.

Estão vivos e atuantes e ainda desfrutam do sentimento de que a impunidade dos seus líderes irá prevalecer. Mas sabem que não dispõem mais do poder desfrutado quando eram amigos de Bolsonaro e de seus cúmplices agora indiciados como golpistas.

Os estragos que Portaluppi causou à imagem do Grêmio ultrapassam os limites do clube. São equivalentes, no ambiente do futebol e mesmo fora dele, aos danos causados pelo bolsonarismo ao Brasil.

Moisés Mendes é jornalista, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora Diadorim). Foi editor especial e colunista de Zero hora, de Porto Alegre

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