“Reserva de poder” – Por Fátima Vilanova

Fátima Vilanova é Doutora em Sociologia

Com o título “Reserva de poder”, eis artigo de Fátima Vilanova, doutora em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará e escritora. “A democracia exige pôr em prática os fundamentos da igualdade, da justiça, que incluem os mesmos direitos e oportunidades aos cidadãos de participar da governança, e do usufruto das riquezas produzidas, sem discriminação. E estes direitos estão sendo negados pelas injustiças tributárias, acrescidas da reserva de poder das indicações políticas para os mais elevados cargos da Nação”, expõe a articulista.

Confira:

Político tem poder demais. A sociedade deve acordar e mostrar aos políticos que o poder é dela. Eles são seus empregados. A democracia só avançará reduzindo o poder dos políticos. E isso só pode acontecer com a sociedade pressionando os partidos, para que eles se transformem em escolas de cidadania, de exemplos de promoção do bem comum, de honradez, dignidade, compromisso com a justiça, e com os princípios da administração pública, como estabelece a Constituição Federal: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, e eficiência.

A sociedade tem que cobrar dos partidos políticos o combate aos vícios da compra de votos nas eleições, rachadinhas, corrupção em licitações, abuso de poder, pelo loteamento da máquina pública, e a reserva de poder, pela indicação política de integrantes das Cortes Superiores, Ministério Público (Quinto Constitucional), Tribunais de Justiça e de Contas. Chega das indicações políticas para estas instituições, por presidente da República e governadores. Esta página necessita ser virada.

O Brasil virou a “casa da Maria Joana”. E chegamos a acreditar que tudo mudaria com a Constituição de 1988, a Constituição Cidadã. Mas o que temos visto é que, quanto mais poder, mais abuso de poder; mais regalias, privilégios; mais reserva de poder para os donos do poder. Os políticos perpetuam-se na política para beneficiar-se, e tratam de fazer um colchão de proteção nas instituições de controle, para que eles não sejam alcançados pelo cometimento de desmandos, de crimes, fazendo da reserva de poder, sua aliada. A quem recorrer? À sociedade. Ela precisa exigir mudanças profundas na política.

A democracia carece ser efetiva, e não somente ato de votar, ser votado, poder chiar, esbravejar, criticar os mandatários de plantão. A democracia exige pôr em prática os fundamentos da igualdade, da justiça, que incluem os mesmos direitos e oportunidades aos cidadãos de participar da governança, e do usufruto das riquezas produzidas, sem discriminação. E estes direitos estão sendo negados pelas injustiças tributárias, acrescidas da reserva de poder das indicações políticas para os mais elevados cargos da Nação. O cidadão comum não pode concorrer aos cargos, em igualdade de condições. Democracia capenga, casta de privilegiados.

O assunto do momento é a escolha de ministro para o STF pelo presidente Lula. Mais uma vez, a indicação política dá as cartas, como presente de amigo para um amigo, num pacto de lealdade e compadrio. E toda a mídia fica a discutir a proximidade do indicado com o presidente, questiona o notório saber jurídico, que deveria ser uma mulher, ou um negro, que deveria ter mandato, mas não avança na correção do método de escolha. As questões da impessoalidade, da necessária concorrência democrática pela vaga, por qualquer brasileiro, através do concurso público de provas e títulos, são ignoradas.

A forma de composição do STF, nada democrática, está inserida na Constituição, com as simples exigências de o indicado pelo presidente da República ser cidadão brasileiro nato, com idade superior a trinta e cinco anos e menos de setenta, detentor de notório saber jurídico, reputação ilibada, e ser sabatinado pelo Senado Federal para aprovação. E, na prática, ter um padrinho forte. E só. Nenhuma palavra sobre concorrência cidadã pela vaga. Reserva de poder aristocrático descarado.

O cargo de ministro do STF, que deveria ser técnico, de guardião da Constituição, configura-se como político, porque a escolha é política, observando-se a transformação do STF em arena de embate de disputas ideológicas. Isto tem que acabar. A sociedade necessita levantar-se pela democratização da forma de ingresso no STF, cobrando mudança da norma constitucional para inserir o concurso público de provas e títulos como forma de acesso.

Esta bandeira urge ser abraçada pelos verdadeiros democratas.

*Fátima Vilanova

Doutora em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC) e autora do livro “Está tudo errado…” (Disponível na Amazon)

Você pode me acompanhar no YouTube, no programa Democracia Radical, nos perfis: @fatimavilanova, @josemariaphilomeno

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