Com o título “Sexo na sinfonia do armador”, eis artigo de Francisco J. Caminha. mais um conto da lavra deste escritor e ex-deputado estadual.
Confira:
A casa era daquelas antigas com faixadas decoradas de azulejos portugueses e localizada no centro histórico da cidade de Aracati no Ceará. No interior da residência os compartimentos internos eram de tijolos crus e a divisão dos quartos com meia parede onde se observava o teto suspenso por caibros de carnaúba.
O compadre foi na cidade para uma audiência no fórum e decidiu visitar uma amiga e após um café de final de tarde, ela insistiu que ele pernoitasse sem necessidade de se hospedar num hotel.
Ela era uma discreta viúva de um amigo dele, mas ainda firme, morando sozinha. Gentilmente, ele aceitou a hospedagem e a noite foi preparado um quarto vizinho ao dela, onde ela armou uma rede cheirosa com um lençol perfumado como quem prepara uma cerimônia.
Naquela madrugada abafada os únicos sons que reverberavam eram o sútil e forte ranger dos velhos armadores das redes que denunciavam que ambos ainda estavam acordados. Lá por volta das duas da manhã a rede dos dois se balançavam no ritmo de desejos e pensamentos lancinantes e libidinosamentes proibidos.
Os sons eram inconfundíveis e acionavam as memórias dos desejos carnais nos ritmos dos rangidos dos armadores que rompiam o silêncio denunciando que ambos estavam em vigília.
Foi então, que ela já cansada soltou uma voz altiva e sem rodeios, típica de quem já não tem mais tempo para perder:
— Compadre, se quiser me faltar com o respeito, venha logo pelo amor de Deus que quero dormir.
Naquela noite, o velho armador da rede dela rangeu mais do que de costume.
*Francisco J. Caminha
Escritor e ex-deputado estadual.