Com o título “Super prédios têm super responsabilidades”, eis artigo de Jayme Leitão, arquiteto e construtor. “aqui, por uma falta de definição de limites minimamente razoáveis da Lei Complementar nº 0343, a Lei da Outorga Onerosa, aprovada em 22/dez/22 (no apagar das luzes dos trabalhos da Câmara de Vereadores daquele ano, sem qualquer discussão da matéria), estamos vendo algumas super agressões ao espaço urbano de Fortaleza,.”expõe o articulist.a
Confira:
Fortaleza tem testemunhado a construção dos primeiros edifícios de grande altura, que uma parte da imprensa batizou de “super prédios”. A verticalização e o consequente adensamento da população são uma tendência sustentável do urbanismo, e certamente muito mais indicada do que o modelo de cidades espalhadas, em que o habitante precisa do carro ou do transporte público para suprir qualquer necessidade. Assim, o que se preconiza hoje é o modelo de urbanismo do qual temos um bom exemplo no Brasil: o bairro do Leblon, no Rio de Janeiro. Lá, o cidadão desce do apartamento, caminha sobre passeios largos e arborizados, para na farmácia, encontra os amigos na lanchonete, vai ao médico, vai ao escritório, tudo isso caminhando, se distraindo com as lojas e cafés – ou seja: aproveitando e fruindo do
espaço urbano.
Dessa forma, a verticalização é necessária para que um contingente maior de população e de serviços ocupe o mesmo espaço. Mas há uma pré-condição que é o segredo do sucesso de grandes cidades verticalizadas, como Nova York: a calçada deve ser espaço privilegiado, amplo, arborizado, com lojas e serviço, com recuos que permitam a circulação prazerosa dos pedestres. E não é isso que estamos vendo na frente dos “super prédios” em Fortaleza: aqui, por uma falta de definição de limites minimamente razoáveis da Lei Complementar nº 0343, a Lei da Outorga Onerosa, aprovada em 22/dez/22 (no apagar das luzes dos trabalhos da Câmara de Vereadores daquele ano, sem qualquer discussão da matéria), estamos vendo algumas super agressões ao espaço urbano de Fortaleza. O próprio princípio de uma lei que abre instrumentos para que a prefeitura faça concessões à legislação urbana mediante pagamento já é um terreno que inspira cuidados – afinal, pagando bem pode-se fazer até o que não deveria ser feito?
E o problema está em que o cidadão pode atribuir isso à questão da altura, mas não é esse o problema. O problema está em que a legislação está sendo utilizada para se viabilizar a venda de terrenos pelo dobro do que valem – e a solução encontrada foi a de construir o dobro do que seria razoável e admissível construir. Como resultado dessa conta maluca, os carros não cabem nos subsolos – e o resultado são verdadeiros paredões de estacionamento que arruínam a vizinhança e os passeios. A calçada em que se caminha ao lado de um paredão é exatamente o contrário das calçadas do Leblon: nelas o pedestre está isolado, caminhando ao lado de uma muralha erguida para depósito de carros. A ventilação, tão importante em Fortaleza, foi pro brejo. E o pior: esses “super prédios”, que deverão durar séculos, estarão construídos em cima de um verdadeiro shopping center vazio, em 2 ou 3 décadas, quando esses estacionamentos estiverem desocupados em função da revolução dos carros
autônomos, que já está em andamento…
Hoje, o que se vê nos folders publicitários é a falácia de jardins verticais que seguramente não conseguirão ser mantidos pelos condomínios, pela óbvia dificuldade de cuidar de uma planta a 12 metros de altura. O resultado é que, brevemente, esses paredões serão revestidos em cerâmica, com plantas de plástico (!) ou algo do gênero. O setor imobiliário não existe para viabilizar a venda de terrenos por preços abusivos, mas para ajudar a promover uma cidade melhor para todos. Prédio com área de lazer no 4º andar não tem uma área de lazer, mas uma laje de lazer inóspita, sem árvores, e a sua relação com a vizinhança é desastrosa. E em algumas regiões menos afortunadas do Meireles já estamos vendo paredões encostados no paredão vizinho, gerando uma quadra de abandono e de desoladora truculência com a cidade que a cerca.
Não é esse o papel do setor imobiliário, nem essas edificações merecem o apelido de “super prédios”. Afinal, parafraseando o herói da Marvel, super prédios devem vir com super responsabilidades…
*Jayme Leitão,
Arquiteto e construtor.
Ver comentários (6)
concordo com o arquiteto Jaime Leitao. Sou a favor de um urbanismo arrojado, prédios como esculturas a seu aberto mas preservando a relação homem X espaço X natureza. O "verde"é importantíssimo, espaços comuns para pedestres, praças permeadas de edificações altas e elegantes: os super prédios com super espaços comuns. Ideal poder ter as duas coisas.
Como? responsabilidade, criatividade, conhecimento, experiencia e competência. Não é fácil, nem para principiante ou amador.
Excelente artigo, excelente reflexão. Parabéns !!!
Estamos destruindo o espaço urbano de nossa bela e suja cidade. Adensar por adensar não é prática saudável em nenhum lugar do mundo. Nossos gestores estão preocupados apenas em arrecadar … Lamentável.
Concordo com o Jayme a cidade precisa com urgência de um tratamento mais humanizado, os bairros e seu entorno precisam atender a todos, moradores e não moradores locais.
Concordo plenamente com o arquiteto sr. Jayme Leytao, Fortaleza é uma cidade quente e estamos sofrendo com estes super prédios, aqui mesmo na frente do prédio que moro estão construindo um, coloquei o nome de minhoca 🐛, as autoridades deveriam ter pensado antes de assinar esta lei, deveriam agir com mais responsabilidades e pensar na geração futura e não só nos dividendos…ao lado também vão reger outro com 56 andares, o vento não circula e vamos acabar sufocada.
Construtibilidade, manutenibilidade e rastreabilidade exigências da super responsabilidade citada por Jaime Leitão com propriedade e coragem, desconhecidas desses incorporadores.
Vaidades.e exibicionismo de interesses imobiliários perversos dos edifícios altos fúria incontida já sem controle.
Os super prédios são bem-vindos! Em poucos anos teremos um belíssimo Skyline em Fortaleza! A cidade será reconhecida como uma capital moderna e destino turístico também por causa dos seus super prédios! A crítica aos andares de estacionamento no sobre solo são válidas , concordo com o arquiteto Jaime Leitão. Os empreendimentos com mais de 30 andares devem ser construídos em terrenos maiores com tamanho suficiente para que as vagas estacionamento fiquem todas no subsolo , deixando o piso térreo livre para jardim e área de lazer , consequentemente mais amigável para a vizinhança !