Em referência ao Agosto Lilás, mês da conscientização e enfrentamento à violência contra as mulheres, a jornalista e escritora Mirelle Costa relata diariamente, neste espaço, casos que servem de alerta a todos nós
Confira:
(O texto abaixo foi escrito por uma mulher vítima de violência doméstica, atendida na Casa da Mulher Brasileira, em Fortaleza. O texto compõe a obra “Após a Morte do Conto de Fadas, a Ressurreição”, publicada pelo Senado Federal, e organizada pela jornalista e escritora Mirelle Costa. Este texto pode conter gatilhos emocionais que podem afetar algumas pessoas).
Nasci em Taguatinga, no Distrito Federal. Tenho cinco irmãos, vim de uma família humilde, porém nunca passamos fome. Tivemos dificuldades, mas sempre vencemos. Sempre fui uma menina alegre, extrovertida, de sorriso fácil e que gostava de fazer amizades.
Passei por muitas fases ruins na minha vida, perdi meu pai aos onze anos e, mesmo sabendo que ele foi um homem ciumento e abusador, eu o amava muito. Minha mãe sofreu muito e nós também, pois não podíamos fazer muita coisa por ela. Tive uma vida conturbada no meio familiar e isso me fez ser forte, mas como toda adolescente, tive uma fase rebelde e, aos quinze anos, tentei suicídio pela primeira vez.
Meus pais se separaram quando eu era muito pequena, mas nunca perdemos o contato com nosso pai. Ele foi embora para outro estado, porém, sempre que podia, vinha nos ver.
Fui crescendo e, aos dezenove anos, tive minha primeira filha. Sofri abuso do marido de minha tia quando estava com quatro meses de gestação. Guardei esse segredo durante anos, até que, um dia, tive coragem de falar para meu ex-marido, quando ele me indagou sobre o comportamento daquele homem comigo. Nunca o denunciei.
Casei, tive dois filhos com meu agressor e, hoje, sou divorciada há dois anos e, mesmo assim, ainda tenho contato com ele, pois ele tem esperança de um dia reatarmos. Porém, nesta nova fase que estou vivendo, não pretendo mais voltar para o lugar onde me causou tanta dor e sofrimento, onde chorei lágrimas de sangue e sempre ouvia as pessoas dizerem: “Ruim com ele, pior sem ele”.
Sem que ninguém imaginasse, muitas vezes, atrás do meu sorriso, eu camuflava uma enorme dor na alma, a qual me deixou com traumas e marcas que só o tempo poderá curar. Aos poucos estou me reerguendo e escrevendo uma nova história em minha vida.
Luz
(Diante de qualquer situação de violência doméstica, ligue 180, é a Central de Atendimento à Mulher, um serviço telefônico do governo federal que oferece acolhimento, orientação e informações sobre os direitos das mulheres, além de receber denúncias de violência contra a mulher)
Mirelle Costa e Silva é jornalista, mestre em gestão de negócios e escritora. Atualmente é estrategista na área de comunicação e marketing