“Uma Felicitância” – Por Mirelle Costa

Uma Felicitância! É assim que a escritora e jornalista Ana Márcia Diógenes define um encontro de amigos regado a uma boa conversa sobre escrita, literatura e vida. Com a obra “Buraco de Dentro”, ela é semifinalista do Oceanos, premiação que existe há vinte e dois anos e contribui significativamente para a visibilidade e valorização da literatura escrita em português, promovendo o intercâmbio cultural e a diversidade de vozes no espaço lusófono. O Prêmio Oceanos 2025 registou um número recorde de 3.142 livros inscritos de 18 nacionalidades diferentes, provenientes de 488 editoras e cobrindo gêneros como poesia, romance, conto, crônica e dramaturgia. Atualmente, o Prêmio Oceanos é administrado pela Associação Oceanos e pelo Itaú Cultural. Associação Oceanos e pelo Itaú Cultural. Sua realização é por meio da Lei de Incentivo à Cultura e pelo Ministério da Cultura. É considerado um dos prêmios literários mais importantes entre os países de Língua Portuguesa.

Para entender como Ana Márcia Diógenes chegou até aqui, convidei-a para uma entrevista pingue-pongue (que mais pareceu um café com bolo) e pedi que ela me falasse sobre suas referências na escrita e na vida, sobre as premiações (principalmente aquelas que não saem nos jornais, mas é como se pendurássemos no peito todos os dias, como uma medalha) e sobre a literatura.

Mais que uns óculos divertidos e cheios de estilo, Ana Márcia carrega no rosto uma leveza de quem tem certeza de si. Certeza sobre os seus afetos, sobre sua escrita e sobre o seu caminhar, tanto que cria um neologismo cheio de personalidade e empresta pra todo mundo que consiga sentir essa mesmasensação que viver intensamente proporciona. Dá vontade de querer ser amiga da Ana Márcia!

Confere aí!

– Quando você começou a escrever?

Eu tive a sorte de viver em uma família que tinha muitos livros. Minha mãe era professora e meu pai bancário. Mas ele também era professor de português, colecionador de discos e sempre comprava muitos livros.

Quando eu era pequena, tive que tomar muitas injeções por conta da garganta, que precisei operar duas vezes. Eu gritava muito para não tomar injeção. Eles tiveram a ideia de a cada injeção que eu tomava me dar um livro de presente. Era um kit com um livro infantil e um disquinho colorido. Não passava a dor, mas ressignificava. Tinha um sofrimento necessário, mas vinha uma alegria no fim. E aí passei a gostar muito de ler.

Depois fui seguindo na literatura juvenil da minha idade, depois nos paradidáticos. Eu não lia só porque a escola indicava. Gostava de me aprofundar na leitura. E tinha a curiosidade de ler todos os livros possíveis de um autor que me interessasse. Procurava em casa e na biblioteca da escola.

– Quem são suas referências literárias?

Eu tive muitas referências bibliográficas. Na infância, li muito o “Contos e lendas dos irmãos Grimm” e Monteiro Lobato. Tenho a coleção até hoje. Adorava revistinhas da Turma da Mônica, Bolota, Luluzinha e os do Walt Disney. Assim como as histórias infantis populares e de folclore. Na adolescência, eu adorava Júlio Verne e autores de aventura e ficção.

Entre as minhas referências de leitura estão: Machado de Assis, José Lins do Rego, Érico Veríssimo, Rubem Fonseca, José de Alencar, Lygia Fagundes Telles, Gabriel Garcia Marques, Saramago, Carolina Maria de Jesus, Conceição Evaristo, Maria Valéria Rezende, Virginia Woolf, Rachel de Queiróz, Jane Austen, Toni Morrison…

Sempre gostei de ler poesia também, como as de Clarice Lispector, Cecília Meireles, Cora Coralina, Adélia Prado, Ana Cristina César, Carlos Drummond de Andrade, Hilda Hilst, dentre outros.

– Seus pais eram leitores?

Meus pais eram leitores. Cada um tinha seus gostos. Minha mãe gostava muito de livros da Agatha Christie e meu pai gostava tanto de clássicos – e ele sempre comprava coleções de clássicos da literatura nacional e internacional – como gostava de crônicas, como as do Stanislaw Ponte Preta (o Sérgio Porto). Foi bem diverso o tipo de literatura que com que eu convivi.

– Como é que foi essa busca pela literatura, se foi concomitante ou se de repente você quando criança já escrevia?

Como comecei a ler com frequência muito pequena, eu sempre fui muito imaginativa. E eu passava muitas horas em clínica de fisioterapia e na natação, devido um problema de escoliose. Nesses momentos em que ficava mais comigo mesma, criava muitas histórias na minha cabeça. Depois comecei a ter vontade de escrever. Então com uns doze anos eu já escrevia e guardava poemas em um caderno. Dia desses eu redescobri este caderno.

Quando nossos filhos eram pequenos, eu e o Miguel Macedo viajávamos muito com eles de carro. E eu gostava também de inventar histórias, de improviso, para diverti-los nas estradas.

O jornalismo como profissão acabou suprindo um pouco – durante um período – o envolvimento com a escrita. Sempre gostei muito do processo de escrever e depois lapidar textos, escolher títulos.

– Hoje você trabalha diretamente com literatura?

Eu trabalhei muitos anos em redação de jornal (catorze anos), de televisão (quatro anos) e em assessoria. Depois fui para o Unicef como comunicadora, e depois gestora. Trabalhei quase treze anos lá. Mas eu tinha um sonho de ser professora e lá eu não poderia acumular dois empregos. Quando saí, fui Secretária Adjunta da Cultura do Ceará e também comecei a ensinar jornalismo. Ao orientar os TCC`s dos alunos concludentes, comecei a pensar que eu deveria voltar a pensar na minha própria produção de textos.

Assim, em 2017 lancei o meu primeiro livro, juvenil, o “De esfulepante a felicitante, uma questão de gentileza”. Na época eu era assessora institucional da Rede Cuca e convivia muito com adolescentes e jovens.

Atualmente sou consultora em comunicação. Tenho feito trabalhos internacionais sobre mídia e direitos de crianças e adolescentes e também sobre abuso e exploração sexual.

– Em relação ao prêmio Oceanos, foi a primeira premiação a qual você é indicado ou já tem outras?

Eu ficava muito envolvida na produção dos meus textos e confesso que me inscrevi pouco nos prêmios nacionais/internacionais. Mas este ano, 2025, resolvi me inscrever em mais premiações.

Em 2023, eu havia recebido uma menção honrosa no Prêmio de Literatura do Ideal Clube, com um conto. Adoro contos também. E agora, em 2025, fui selecionada entre os 25 semifinalistas na categoria prosa do Prêmio Oceanos, que é um dos prêmios literários mais importantes entre os países de língua portuguesa. Fiquei muito honrada com o resultado.

– Quantos livros você já publicou?

Como produção autoral, tenho nove publicações: o livro juvenil “De esfulepante a felicitante, uma questão de gentileza” (Dummar, 2017), os contos longos “Pérfuro-matante” (2022) e “Reze que meus pés não apontem para você” (2023), o livro artesanal “Poesia e contos pequetitos” (2022), o livro de poesia “Rosa dos ventos” (Minimalismos,2023), o jogo poético “Tabuleiro de poemas” (2024), o infantil “Entrou injeção, saiu o quê?” (Quichaitá, 2024), o romance “Buraco de dentro” (Patuá, 2024) e o poema narrativo “Caso porque te amo, mato porque me amo” (Quichaitá, 2025).

– Como você fez para escrever e publicar livros com tanta qualidade em um curto espaço de tempo de uma obra para outra?

Desde 2022 tenho me dedicado à escrita diariamente. No mínimo um expediente por dia é para a literatura. Escrevo todos os dias. E reservo tempo para frequentar oficinas ou ministrar oficinas, além de participar de clubes de leitura. Na minha rotina de escrita quando estou escrevendo um livro, fico no mínimo três a quatro horas por dia dedicada a ele. Reservo um mesmo horário e faço quase o impossível para manter este plano de trabalho. Uso o restante do tempo para ler, fazer resenhas, interagir com leitores e escritores nas redes sociais, ir a eventos culturais.

Tenho algumas escritas fixas, fora os livros: minha coluna de comportamento no O Povo Mais, que é quinzenal e publicada às quartas. Também às quartas, quinzenalmente e revezando com a coluna, escrevo uma crônica ou conto. E aos domingos sempre publico uma crônica. Os contos e crônica eu publico no Instagram (@namarcia) e no Substack (anamarciadiogenes).

– Você tem essa questão do bloqueio criativo? Como é que você lida com seu bloqueio criativo?

Eu sou muito determinada. Então o bloqueio criativo ele só raspa assim de passagem. Se eu tiver um dia mais cansativo e precise escrever, eu ouço música, leio, dou um passeio na praça ou na praia, e aí a vontade de escrever começa a pulsar.

– O que é uma felicitância pra você que celebra tanto as felicitâncias dos outros?

Uma felicitância grande que eu tenho na vida é minha parceria com Miguel (esposo). Para além da profissão, carregamos a alegria de caminhar juntos, dando sempre o melhor pedaço de Bis pro outro…. (risos). Criamos nossos filhos dessa forma, com conhecimento e afeto. Eles cresceram lendo revistas, como Recreio e Superinteressante, colecionando memórias conosco indo para teatro e piquenique e com a liberdade que eles precisavam ter. Os dois escolheram a área de humanas também, estão fazendo doutorado e hoje o nosso maior prêmio é termos dado essas asas possíveis para eles seguirem, de forma ética e solidária.

Caminho se conhece andando, Minha Gente!

Essa indicação da Ana Márcia ao prêmio Oceanos diante de 3.142 inscritos é merecida e o resultado de uma construção.

Que venham mais indicações, mais neologismos carinhosos e mais livros, Ana Márcia!

Que orgulho de Você! <3

(O livro ‘Buraco de Dentro’ concorre ao Oceanos Prêmio de Literatura em Língua Portuguesa. O romance acompanha uma família formada por um casal e três filhos que se escondem em um bueiro e tentam sobreviver nas condições precárias. A obra da cearense retrata a vida, exclusão, sobrevivência e sociedade).

Mirelle Costa e Silva é jornalista, mestre em gestão de negócios e escritora. Atualmente é estrategista na área de comunicação e marketing

Eliomar de Lima: Sou jornalista (UFC) e radialista nascido em Fortaleza. Trabalhei por 38 anos no jornal O POVO, também na TV Cidade, TV Ceará e TV COM (Hoje TV Diário), além de ter atuado como repórter no O Estado e Tribuna do Ceará. Tenho especialização em Marketing pela UFC e várias comendas como Boticário Ferreira e Antonio Drumond, da Câmara Municipal de Fortaleza; Amigo dos Bombeiros do Ceará; e Amigo da Defensoria Pública do Ceará. Integrei equipe de reportagem premiada Esso pelo caso do Furto ao Banco Central de Fortaleza. Também assinei a Coluna do Aeroporto e a Coluna Vertical do O POVO. Fui ainda repórter da Rádio O POVO/CBN. Atualmente, sou blogueiro (blogdoeliomar.com) e falo diariamente para nove emissoras do Interior do Estado.

Ver comentários (4)

  • Ana Márcia é dinâmica, focada, tem uma visão além, parabéns, para a ela e para você que soube tão bem dá vida as palavras.
    Agradecer, outra vez o fato de minhas considerações estarem vivas no seu espaço.
    Um abraço

  • Ana Márcia é um "Oceanos" de imaginação, capacidade e versatilidade.

  • Adorei a matéria e adorei conhecer mais uma escritora brasileira.

  • Que texto e entrevista gostosa de ler.
    Adorei conhecer um pouco da rica história da Ana Márcia.

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