“Muitas pessoas recorrem ao encastelamento para se proteger da insegurança da sociedade contemporânea, mas essa estratégia pode aumentar o medo e a desconfiança”, aponta o arquiteto Totonho Laprovitera.
Confira:
Ainda estudante, na Escola de Arquitetura da UFC, aprendi que as cidades são as pessoas, e espelham a essência de seu povo. Cada espaço público carrega histórias, emoções e vivências. Assim como os indivíduos, as cidades evoluem, transformam-se e guardam suas identidades. Nesse trato, as pessoas desenham o espaço urbano, enquanto a cidade influencia a vida de quem nela habita. As relações humanas são o que realmente dão vida e significado aos ambientes urbanos.
Para que haja diálogo entre as pessoas no espaço urbano, a inclusão dos viventes ocorre a partir do olhar entre eles, ao abraço pleno de urbanidade. Como consta no pai-dos-burros, urbanidade é a “qualidade ou condição de ser urbano; em sentido figurado, é o conjunto de formalidades e procedimentos que demonstram boas maneiras e respeito entre os cidadãos; afabilidade, civilidade, cortesia”. Meu amigo Ricardo Figueiredo Bezerra sempre nos lembra disso.
Muitas pessoas recorrem ao encastelamento para se proteger da insegurança da sociedade contemporânea, mas essa estratégia pode aumentar o medo e a desconfiança. A verdadeira segurança vem de comunidades unidas, baseadas no diálogo, empatia e cuidado mútuo. Criar ambientes de convivência é uma maneira eficaz de enfrentar a insegurança, promovendo laços que valham uma cultura de paz.
Pois bem. Quando passo pelas calçadas e vejo prédios com torres sobre plataformas de estacionamento, sinto o silêncio da solidão da cidade me envolver. Sinto uma saudade imensa das “cadeiras na calçada”, momentos em que podíamos nos sentar e conversar com os vizinhos, entre risadas e histórias.
Esses convívios, tão simples, pareciam dar vida às ruas, transformando o ambiente em um espaço acolhedor e cheio de vivacidade humano. Agora, muitas vezes me vejo cercado por construções que afastam as pessoas umas das outras. É triste perceber que, em meio ao avanço urbano, o verdadeiro sentido de comunidade parece se perder. Anseio por dias em que as calçadas voltem a ser lugares de encontros, onde as vozes e os sorrisos possam novamente ressoar.
Mas somos inteligentes e capazes de encontrar soluções para preservar nossa qualidade de vida, mesmo diante das caixas de estacionamento elevadas que ameaçam o espaço urbano. Recordo-me de uma aula na Escola de Arquitetura, quando o professor José Nasser Hissa, de forma provocativa, questionou: “Para que facilitar se dá para complicar?” Pois é, muitas vezes, complicamos o que é simples e esquecemos de buscar um equilíbrio que promova o bem-estar nas cidades. É possível, sim, conciliar a funcionalidade dos estacionamentos com ambientes mais humanos e acolhedores, onde a convivência e a cultura possam prosperar.
Enfim, pratiquemos a gentileza urbana.
Totonho Laprovitera é arquiteto, escritor e artista plástico