Com o título “Voto impresso e voto auditável”, eis artigo de Djalma Pinto, advogado, escritor e mestre em Ciência Política. Ele bate na tecla de um tema já de olho nas eleições de 2026.
Confira:
Faz tempo que o Brasil adia a discussão do tema “exibição do comprovante impresso do voto”. Nada menos do que quatro normas exigem essa providência. A primeira, Lei nº 9.100/95, que implantou o sistema eletrônico de votação, dispunha de forma enfática: “A máquina de votar imprimirá cada voto, assegurado o sigilo e a possibilidade de conferência posterior para efeito de recontagem” (art. 18, § 7º). No que pese a reiteração da ordem imposta nesses diplomas legais, doutrinadores e especialistas não abordam essa matéria. A excessiva politização desse tema acabou gerando o vandalismo do dia 8 de janeiro de 2023, com prisões e condenações de muitas pessoas. Uma reflexão, porém, parece oportuna a partir desta indagação: quem são os destinatários das eleições? Seriam os profissionais da área de informática, os técnicos da Justiça Eleitoral, as instituições credenciadas para auditar e fiscalizar o sistema eletrônico de votação, o TCU, os partidos políticos, a OAB ou os eleitores?
A resposta a essa indagação encontra-se no parágrafo único do art. 1º da Constituição: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.” Portanto, se somente aos eleitores é assegurada a prerrogativa de escolha dos seus representantes para o exercício do poder político, é somente a eles que todos os mecanismos das eleições se destinam. O fato de a urna eletrônica ser auditada pelos diversos especialistas de diferentes órgãos e representantes partidários não pode retirar a legitimidade do cidadão de exercer a sua auditagem pessoal. Esta, como reiterado pelas diversas leis, deve ser feita por meio da exibição do comprovante impresso do voto, sem contato manual, após confirmar o número do seu candidato no microcomputador desenvolvido para o processo eleitoral em que recebidos e armazenados os votos. Sob pena de lhe ser retirada a condição de detentor ativo de uma parcela da soberania popular, assegurada pela Constituição e reiterada pelos representantes do povo no Legislativo. O Direito Comparado, por sua vez, fornece os esclarecimentos sobre a necessidade de ser
assegurado a cada eleitor o direito de visualização do seu voto.
Em 2009, a Corte Constitucional da Alemanha anulou a eleição, realizada naquele País em 2005, por meio eletrônico sem impressão do voto. O fundamento para essa deliberação merece especial atenção: "A eleição como fato público é o pressuposto básico para uma formação democrática e política. Ela assegura um processo eleitoral regular e compreensível, criando, com isso, um pré-requisito essencial para a confiança fundamentada do cidadão no procedimento correto do pleito. A forma estatal da democracia parlamentar, na qual o domínio do povo é midiatizado através de eleições, ou seja, não exercido de forma constante nem imediata, exige que haja um controle público especial no ato de transferência da responsabilidade do Estado aos parlamentares", afirmou o juiz Andreas Vosskuhle ao anunciar a decisão do tribunal. Foi mais enfática a Corte máxima alemã: “um evento público como uma eleição implica que qualquer cidadão possa dispor de meios para averiguar a contagem de votos, bem como a regularidade do decorrer do pleito, sem possuir, para isso, conhecimentos especiais. […] O cidadão comum, neste caso, não tem meios para apurar possíveis erros de programação ou manipulações propositais. Neste sentido, acreditam os juízes alemães, houve, com o uso da urna eletrônica nas eleições de 2005, uma transgressão das leis que garantem o pleito como um fato público.” (https://www.dw.com/pt-br/tribunal-alem, consulta em 08/09/2025).
Com um eleitorado formado por milhões de analfabetos e milhões de pessoas sem educação básica completa, o mínimo que pode ser assegurado a essa parcela expressiva dos detentores da soberania popular é a exibição do comprovante impresso do voto, após a digitação no teclado do número do candidato. Sem acesso aos meandros da tecnologia, ficam esses cidadãos à mercê dos especialistas que, mesmo com toda a qualificação e seriedade na sua atuação, não podem suprimir o seu direito a simples visualização do comprovante impresso do seu voto, com a preservação do
sigilo, tal como proposto pelos próprios criadores da urna eletrônica nos idos de 1995.
*Djalma Pinto
Advogado, Mestre em Ciência Política e autor de diversos livros entre os quais “Ética na Política”, “Direito Eleitoral – Anotações e Temas Polêmicos”, “Direito Eleitoral – Improbidade Administrativa e Responsabilidade Fiscal”, “Distorções do Poder”, “Educação para a Cidadania” e “Cidade da Juventude”.
Uma resposta
Sempre brilhante.
Cabe registrar que se os votos forem impressos e guardados na urna então todas as dúvidas serão logo eliminadas, pois os totais deverão ser exatamente iguais ao do BU, boletim de urna.
Como os votos nulos e brancos já teriam essa informação no voto impresso então os antigos “recursos” que faziam utilizando-se uma caneta para alterá-los não seria mais possível.
Aliás a escolha por um candidato também não poderia mais ser modificada na contagem ou recontagem tal como fraudadores faziam antes usando também uma caneta para fazer outra marcação.