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“Mate-me que eu já te matei!”

Edificio São Pedro em foto de Aurélio Alves.

Com o título “Mate-me que eu já te matei!”, eis esta peça literária de Ricardo Kelmer, jornalista, escritor e roqueiro. Ele aborda e lamenta o caso da demolição programada do edifício São Pedro, em Fortaleza.

Confira:

No cenário apocalíptico de uma Praia de Iracema decadente e violenta, o detetive Eládio Ratoeira investiga estranhos crimes envolvendo personagens típicos do bairro. Numa esquina, a travesti Ellen Star é abordada por um jovem casal. Enquanto conversam, trechos de uma música acompanham a ação. É “Lupiscínica”, bolero de Petrúcio Maia e Augusto Pontes: Mate-me, que eu já te matei…

Este conto, “Crimes de paixão”, presente no livro “Guia de sobrevivência para o fim dos tempos”, é um policial noir com toques surrealistas, e foi escrito em 1994. Nele, tentei expressar meus sentimentos de inconformismo com a triste situação da boemia da Praia de Iracema. Eu estava pessimista, sim, mas o futuro, infelizmente, se mostraria ainda pior.

Março de 2024. Eu olho para o Edifício São Pedro e posso ouvi-lo murmurar, resignado, num fiapo de voz:

– Vi tantas coisas, você nem pode imaginar. Agora, todos esses momentos se perderão no tempo como lágrimas na chuva…

– Sinto muito por tudo terminar dessa maneira – respondo, sem saber o que dizer.

– Não sofra. Isso não passa de um teatro ridículo.

– Como assim?

– Eles fingem se preocupar com a cultura, com a memória da cidade, mas sentem prazer em apagá-la.

Olho outra vez para ele, e há uma certa majestade que resiste em suas apodrecidas ruínas. Tenho vontade de dizer que, mesmo nessa situação deprimente em que se encontra, ele é belo. Mas não, não há beleza no reino da ganância. O belo que vemos é tão somente o reflexo do amor à nossa própria história. Essa mesma história que agora desmorona diante dos nossos olhos.

– Hora de morrer…

Adeus, velho amigo. Por aqui, ficamos nós. Nós que já estamos mortos.

*Ricardo Kelmer,

Escritor, jornalista e roqueiro — blogdokelmer.com

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Uma resposta

  1. Solidariedade ao escritor pelo sentimento do triste fim da boemia da Praia de Iracema. Quando os poetas ficam sem a boemia para inspiração no lirismo é sinal de tempos sombrios. Nada pode ser pior para os boêmios que a melancolia silenciosa da falta de inspiração. Como amante da boemia eu peço: não deixem o samba morrer…

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