Com o título “Violência espantosa exige reação”, eis artigo de Djalma Pinto, advogado, professor e ex-procurador-geral do Estado. “Falta, porém, na educação contemporânea, sob a responsabilidade dos pais e da escola, o ingrediente dos valores”, expõe o articulista.
Confira:
Um fato intrigante tem chamado a atenção de muitos brasileiros. A despeito do acesso à escola, do reconhecido aumento da escolaridade, do crescente número de faculdades disponibilizadas aos jovens em todo o País, o nível de violência, notadamente de assaltos e homicídios, tem aumentado de forma assustadora.
Os jornais, entre os quais a Tribuna de Minas, acabam de divulgar o ranking de criminalidade internacional da plataforma Numbeo.com Nada menos do que oito cidades brasileiras estão relacionadas entre as 50 mais perigosas do mundo. Caracas, capital da Venezuela, encabeça a listagem. Rio de Janeiro aparece em sétimo e Fortaleza comparece em nono lugar, seguida de Salvador, em décimo.
Os jovens das gerações passadas circulavam pelas ruas de suas respectivas cidades, sem receio de serem agredidos, com armas, para subtração dos seus pertences. O paradoxo, então, não deixa de ser espantoso. Aumentou-se a escolaridade do brasileiro e, contraditoriamente, o País constatou a elevação da criminalidade na sua população.
Há pouco, ouvi, atentamente, o relato de um cidadão iletrado. Não frequentou escola alguma. Lamentava-se por haver perdido as oportunidades, surgidas após deslocar-se para a capital. Relembrava de sua infância, há mais de cinquenta anos, em uma localidade distante, alguns quilômetros de um distrito de Boa Viagem.
Sem se dar conta, ofereceu valiosa justificativa para a “explosão dos furtos”; da predisposição para o assalto ao dinheiro público e privado, em todos os locais, na sociedade contemporânea: a ausência de pedagogia eficaz para conter os impulsos para a prática de crime.
Rememorava ele que, à noite, no povoado de sua infância, sem luz elétrica, com os seus primos se deslocavam para a casa de seu avô. Ali, no chão, ouviam atentamente as histórias contadas pelo idoso, sentado na única cadeira disponível no recinto. Dia sim, outro também, intercalava ele às suas narrativas esta advertência:
– Nunca passe a mão no alheio. Se você fizer isso, vai ser chamado de ladrão. A polícia vai lhe prender, raspar sua cabeça e passar piche. Os netos se entreolhavam apavorados e o avô, percebendo a aflição, retomava seu colóquio com estórias mais amenas. Por ser a escola ser muito distante e não haver motivação para frequentá-la, permaneceram quase todos sem instrução básica.
– Quantos se envolveram com o crime, quantos optaram por assaltado, após se tornarem adultos? – a indagação foi imediata. O interlocutor espantou-se com a pergunta e com a constatação de que nenhum deles fez opção pela “subtração do alheio”. Ou seja, sem noção alguma de pedagogia, sem nunca haver frequentado nem passado perto de uma escola, o velho sertanejo contribuiu para a paz social de sua comunidade. Com sua metodologia particular, evitou que seus descendentes ameaçassem os seus semelhantes.
A evolução e a preservação dos direitos humanos tornaram obsoletos os métodos, utilizados por aquele avô, que desestimularam os netos da opção pela criminalidade. Falta, porém, na educação contemporânea, sob a responsabilidade dos pais e da escola, o ingrediente dos valores. A sedimentação da empatia, do estímulo à honestidade e respeito pelo dinheiro público. Sem isso, corremos o sério risco de continuarmos a caminho do pódio no rank da criminalidade. É indesejável, sob todos os aspectos, mas se nada for feito, acabaremos obrigados a viver na cidade mais violenta do planeta. O nono lugar, por si só, já sinaliza nessa direção e exige inadiáveis providências dos pedagogos, sociólogos, juristas, publicitários do governo, que consomem verbas expressivas na propaganda oficial, sem qualquer caráter educativo, dos veículos de comunicação, dos pais e mães, enfim, de toda a sociedade.
*Djalma Pint6o
Advogado, autor de diversos livros entre os quais Ética na Política, Distorções do Poder e Pesquisas Eleitorais e a Impressão do Voto.