“A palavra em silêncio” – Por Tuty Osório

Ainda que não mais seja
Tuty Osório é jornalista, publicitária e escritora

“O que mais me assusta é essa onda de fórmulas mágicas para a saúde física, mental, espiritual”, aponta a jornalista e publicitária Tuty Osório

Confira:

Dizem que há cérebros apodrecidos pelo excesso de telas. Em todas as gerações. Dizem, também, que ler livros de papel combate esse mal; escrever, principalmente à mão, é outra ação eficaz; e, pasmem, ou não pasmem, sei lá o que pode mesmo nos surpreender, ainda – subir escadas também é bom para o cérebro não adoecer.

Não estou de brincadeira, juro. Até pretendo desenvolver o meu lado engraçado, se é que o possuo, mas não é esse o caso, aqui. Eu vi, li, ouvi, todas essas descobertas, recentemente. O que mais me assusta é essa onda de fórmulas mágicas para a saúde física, mental, espiritual.

A alimentação salva. O exercício salva. A amizade salva. O amor, então! Do viço da pele à agilidade dos pés. Passando pelos estômagos envenenados pelo refluxo e pelos intestinos inflamados pela lactase. Dores, dormências, tremedeiras, tonturas, angústias, desânimos persistentes, euforias ameaçadoras.

Às vezes parece que a distopia de alguns sonhos atravessou o inconsciente e veio existir fora de nós. Aliás, nesse modelo, instala-se mais dentro, que jamais. Traz sofrimento, medo. Aquele grito que não grita porque está aprisionado no sonho. Só que não está mais. O sonho escapou trazendo com ele as contações absurdas, vestidas de novos normais.

A ótima nova, não tão nova, é que ainda se escreve poesia, diz-se poesia, somos mais românticos que clássicos, mais gaivotas que olmos*, embora saibamos que uns carecem dos outros para seguir ou não seguir. Repetimos, demais, que é preciso seguir. Não sabemos , bem, como, para onde ou porque vamos. Só que vamos ou deveríamos ir. Esquecidos, talvez, que ficar é uma possibilidade bela, plena.

Pois, se atiro ao vento as minhas alocuções, repletas de verbo ou de aquarelas, é sinal que estou, estás, estamos, estaremos, cá ou além.

*A Gaivota, teatro de Tchekhov, que disserta a respeito dos voos e das raízes da alma humana. Tchekhov criou a peça como comédia, embora parte do público a receba como um drama, ou mesmo uma tragédia,

Tuty Osório é jornalista, publicitária, especialista em pesquisa qualitativa e escritora. Lançou em 2022, QUANDO FEVEREIRO CHEGOU (contos); em 2023, MEMÓRIAS SENTIMENTAIS DE MARIA AGUDA (10 crônicas, um conto e um ponto) e SÔNIA VALÉRIA A CABULOSA (quadrinhos com desenhos de Manu Coelho); todos em ebook, disponíveis, em breve, na PLATAFORMA FORA DE SÉRIE PERCURSOS CULTURAIS. Em dezembro de 2024 lançou AS CRÔNICAS DA TUTY em edição impressa, com publicadas, inéditas, textos críticos e haicais

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