Com o título “A Democracia Vendida e o Ciclo do Poder Corrompido”, eis artigo de Maurício Filizola, empresário e diretor do Sincofarma-CE. “Quando esses políticos compram votos, não o fazem com recursos próprios. O dinheiro usado para financiar suas campanhas é desviado de escolas que não foram construídas, hospitais sem remédios, creches sem vagas”, expõe o articulista.
Confira:
Há uma ironia cruel no funcionamento do sistema político brasileiro, onde a força do voto – tão celebrada em campanhas eleitorais – é, na prática, uma moeda de troca. Não é o eleitor que escolhe o político; é o político que compra o eleitor. E assim, a democracia, que deveria ser o palco da representação popular, torna-se um teatro de ilusões sustentado por práticas escusas que começam na base e se consolidam no topo.
Tudo começa nas periferias, nas comunidades carentes, onde as lideranças locais são cooptadas por políticos para montar suas “listas”. Cada nome na lista representa um voto potencial, comprado por valores que variam entre R$ 100 e R$ 200. O líder comunitário embolsa uma parte, repassa o resto para o eleitor, e o ciclo se fecha. Vender o voto passa a ser, para muitos, uma necessidade diante da ausência de políticas públicas efetivas. Mas o que parece um ganho momentâneo para o eleitor é, na verdade, um prejuízo colossal para todos.
Quando esses políticos compram votos, não o fazem com recursos próprios. O dinheiro usado para financiar suas campanhas é desviado de escolas que não foram construídas, hospitais sem remédios, creches sem vagas. Após eleitos, o ciclo de corrupção se amplifica. Em Brasília, esses mesmos políticos negociam emendas parlamentares, destinadas supostamente a beneficiar estados e municípios. As chamadas “emendas PIX” deveriam ser ferramentas para suprir necessidades locais, mas se tornam veículos de enriquecimento ilícito.
Os deputados citados em denúncias recentes seguem um roteiro já conhecido. Enviam milhões em emendas a prefeituras previamente alinhadas e, em troca, recebem “comissões” que variam entre 10% e 20% do valor total. Esse dinheiro, que deveria financiar saúde, educação e infraestrutura, retorna aos bolsos daqueles que deveriam fiscalizar sua aplicação. Enquanto isso, a população, enganada, permanece sem atendimento médico, sem escolas adequadas, sem saneamento básico. A corrupção, assim, não é apenas um desvio de recursos; é um roubo de oportunidades e vidas.
Esse esquema alimenta um ciclo perverso de perpetuação no poder. Deputados eleitos através da compra de votos usam a máquina pública para financiar suas próximas campanhas. As lideranças comunitárias, cooptadas por migalhas, continuam reproduzindo o sistema. E os eleitores, desiludidos, permanecem presos à falsa ideia de que “pelo menos o dinheiro do voto ajuda a pagar as contas”. Enquanto isso, a democracia vai sendo minada, substituída por um mercado de votos onde quem paga mais leva.
Os prejuízos vão além dos recursos desviados. A confiança nas instituições públicas é corroída, o senso de coletividade se desfaz, e a ideia de que a política pode ser um instrumento de transformação é substituída pela descrença e pelo conformismo. Em vez de projetos de longo prazo, voltados ao bem-estar da população, o que se vê é uma política imediatista, voltada apenas para os interesses de quem detém o poder.
A questão que se impõe é: como romper esse ciclo? A resposta não é simples, mas passa pela educação política e pela fiscalização rigorosa. Eleitores precisam entender que seu voto tem um valor que vai além do dinheiro recebido; ele é a chave para transformar sua realidade. Órgãos de controle precisam ser fortalecidos para garantir que o dinheiro público não seja um prêmio para corruptos, mas uma ferramenta para atender às necessidades da população.
Por fim, é necessário repensar a estrutura das emendas parlamentares, garantindo total transparência e rastreabilidade dos recursos. Somente assim será possível quebrar o ciclo da corrupção e devolver à democracia sua verdadeira essência.
“Enquanto o voto for vendido, a liberdade será comprada. Um país só muda quando seu povo entende que nenhum preço pode ser maior que o valor de uma democracia verdadeira.”
*Maurício Filizola
Empresário e diretor do Sincofarma-CE.
Uma resposta
Brilhante comentário.
O fundo eleitoral é mais uma forma, LEGAL infelizmente, de tirar recursos de saneamento e saúde para dar a candidatos que apenas prometem o paraíso.