“Gatos são as tricas de tipos ou letras, a grelhas, quando os tipos ficam de cabeça para baixo ou fora do formato do texto em construção no componedor”, aponta o cientista político e escritor Paulo Elpídio de Menezes Neto. Confira:
Das artes da tipografia e de como cometer gatos e gralhas em composição tipográfica, sou dos poucos remanescentes da tipografia, na trilha sedutora aberta por Gutenberg com os seus tipos móveis.
Quando menino, ganhei de meu pai uma caixa de tipos e um componedor. Depois as escovas de provas e uma impressora manual. Compunha meus textos com os tipos móveis, sem intermediários, e usava o papel para imprimir as manchas ou texto. E o fazia como se fosse um jornal de página única…
Até conhecer melhor a linotipo, a novidade que ameaçava a técnica a primeira vista, insuperável, dos tipos móveis de Gutenberg, Bodoni e Garramond, fazia minhas composições a mão, letrinha por letrinha…
Construído o texto tipográfico, a prova era o passo mais sensato a dar em seguida para a correção dos “gatos” e das “gralhas”. Não houve tipógrafo ou linotipista, muito menos os digitadores da modernidade virtual, que não os criasse nis seus tropeços.
Gatos são as tricas de tipos ou letras, a grelhas, quando os tipos ficam de cabeça para baixo ou fora do formato do texto em construção no componedor.
Monteiro Lobato queixava-se dos gatos que impresso o texto ficavam a por a língua para o leitor. As gralhas, em edições antigas valorizavam o livro e entre colecionadores, antiquários e alfarrabistas tornavam-nos raros, peças de colecionadores.
Entre editores permissivos, as raridades era produto de erro intencional. Scott Thurow, misto de advogado com escritório na Califórnia, e romancista “polar”, de histórias policiais, escreveu um livro, “Edições Perigosas”, cujo personagem principal era justamente um falsificador ardiloso, editor e livreiro em São Francisco.
Pois esse fabricante de raridades produziu com comedimento e asseio gatos gralhas, letras de cabeça-para-baixo, erros de composição, datas trocadas, número de páginas fora da sequência. Separava uma certa quantidade de exemplares , deixava-os a envelhecer ao sol, cuidava por amarelecer as páginas, criava um “ex-líber” para indicar o antigo proprietário. Usava de todas as artimanhas de uma fraude distinta, para levar qualquer colecionador abonado de vontade e de grana, ao orgasmo de connoisseur ludibriado. Estava pronto mais um livro raro com, pelo menos, 20 exemplares ocultamos, expostos comedidamente, para aguçar o desejo dos colecionadores.
No romance, se bem me lembro, havia um assassinato, um colecionador tirou a vida do editor-livreiro por justa causa: descobriu que gira enganado. Mas não foi pelo dinheiro, mas pelo prestígio perdido de colecionador por muitos invejado.
Paulo Elpídio de Menezes Neto é cientista político, professor, escritor e ex-reitor da UFC