Com o título “É a Lei”, eis artigo de Tales M. de Sá Cavalcante, reitor do FB Uni, diretor-geral da Organização Educacional Farias Brito e presidente da Academia Cearense de Letras.
Confira:
O jogo era decisivo. Para o Ceará sagrar-se campeão, bastava-lhe o empate. O Ferroviário precisava ganhar, mas o que víamos no Castelão nos dava a impressão contrária. Os jogadores do Vovô, aguerridos em busca do gol, e os do Ferrim, tranquilos, a contentar-se com os toques de bola.
No intervalo, encontrei um amigo, como eu, torcedor do Ferroviário, que logo disse: “Viu aí o que é um time cadenciado?” Insatisfeito com a atuação de minha equipe preferida, lembrei que o amigo era apaixonado pelo Ferrim. É perfeitamente aceitável a paixão nos esportes, com as devidas exceções, como considerar inocente, por ser do seu time, um goleiro que assassinou a própria namorada por motivo torpe.
Entre seres humanos, a paixão é por demais evidenciada na seguinte menção atribuída à historiadora Déa Fenelon: “O amor é o movimento permanente do coração, e a paixão é o movimento violento da alma.” Já a paixão por um(a) político(a) ou um partido político, a meu juízo, é fora de propósito, razão pela qual, no último julgamento da 1ª Turma do STF, não torci por A, B ou C.
Mas ressalto o êxito da mnistra Cármen Lúcia, em especial, ao destacar o brilho de Victor Hugo no livro “História de um crime”, que analisa um golpe de Estado ocorrido há quase 170 anos. O escritor francês estabeleceu o seguinte diálogo entre alguém da Armada e uma autoridade:
– “Você acredita nisso?
– Sem dúvida. Nós somos a minoria e seríamos a maioria. Nós somos uma porção da Assembleia e agiríamos como se fôssemos a Assembleia inteira. Nós, que condenamos a usurpação, seríamos os usurpadores. Nós, os defensores da Constituição, afrontaríamos a Constituição. Nós, os homens da lei, violaríamos a lei. Um golpe de Estado.”
O outro responde:
– “Sim, mas um golpe de Estado para o bem.”
Ele diz:
– “O mal feito para o bem continua sendo mal.”
– “Mesmo quando ele tem sucesso?”
Ele diz:
– “Principalmente quando ele tem sucesso.”
– “Por quê?”
– “Porque então ele se torna um exemplo e vai se repetir.”
O outro ainda redarguiu:
– “Mas a razão de Estado existe.”
Ele diz:
– “Não, o que existe é a lei, é o Estado de Direito.”
*Tales M. de Sá Cavalcante
Reitor do FB Uni, diretor-geral da Organização Educacional Farias Brito e presidente da Academia Cearense de Letras.
tales@fariasbrito.com.br