Pelos 40 anos da eleição de Tancredo Neve, que marcou o fim do regime militar no Brasil, o jornalista Nicolau Araújo nos oferece um conto escrito em 1983, quando ainda estudante do ensino médio, antes da candidatura de Tancredo. Ao final do texto, o jornalista nomeia a bicharada
Confira:
Em algum lugar das Américas, havia uma selva que por muito tempo fora reinada por um leão. O reino, além do rei, era comandado pelo irmão de sua majestade, o tigre, pela caduca e quase surda hiena, que transmitia à bicharada tudo o que o rei dizia, e pelo primeiro-ministro, o elefante.
A bicharada estava descontente com o rei por causa de seu ministro. Mas o elefante tinha a proteção da USA – União das Selvas Americanas. Com poderes sobre a economia do reino, o elefante permitia uma imensa exploração da USA na selva.
Um dia, o rei, queixando-se à hiena, disse:
– Sou como Nero, dos meus bichos não sinto mais é afeição!
A hiena arregalou os olhos, tropeçou em suas patas e correu rumo à rádio oficial.
– Notícia do rei! Já estou velho, diga aos bichos que haverá eleição!
A selva entrou em festa, os partidos se manifestaram, o rei teve um desmaio.
A eleição seria mantida, pois, pela tradição, a palavra real não teria volta.
O rei e seu impiedoso ministro então bolaram um plano: o macaco se lançaria como candidato real e a eleição seria indireta. Mantendo, assim, a ideologia política detestada pelos bichos, mas favorecida à USA.
O macaco passou a fazer campanha por todo o reino, assim como o tigre, que tinha a simpatia da bicharada. Havia ainda a raposa, essa com poucas chances, mas, com inteligência e uma grande fortuna, conversava ($$$) os bichos eleitorais.
Em suas andanças, o macaco chegou ao deserto. Lá, recebeu críticas do falante papagaio.
O rei dizia:
– É apenas um falante papagaio de areia quente!
A hiena repetia:
– É apenas um papagaio cearense! Essa já falava o que não sabia. Ou sabia?
A eleição estava próxima. O rei, contente, gabava-se à hiena:
– Estarei no poder de novo. A eleição será quieta!
Novamente, a hiena arregalou os olhos, tropeçou em suas patas e correu rumo à rádio oficial.
– Notícia do rei! Entregarei o poder ao povo, a eleição será direta!
Rapidamente, a selva se fechou. Como toda ave de rapina, tive o olho clínico para fugir. Antes da fuga, vi a hiena como prato real. E a última notícia que tive sobre a eleição foi que deu zebra.
Anotações: presidente Figueiredo (leão), vice-presidente Aureliano Chaves (tigre), ministro Delfim Netto (elefante), porta-voz Carlos Átila (hiena, quase sempre era desautorizado por Figueiredo), Mário Andreazza (Macaco, a pré-candidatura não vingou), Raposa (Paulo Maluf, disputou com Tancredo), Papagaio (Gonzaga Mota, governador no Nordeste, da areia quente).
Nicolau Araújo é jornalista pela Universidade Federal do Ceará, especialista em Marketing Político e com passagens pelo O POVO, DN e O Globo, além de assessorias no Senado, Governo do Estado, Prefeitura de Fortaleza, coordenador na Prefeitura de Maracanaú, coordenador na Câmara Municipal de Fortaleza e consultorias parlamentares. Também acumula títulos no xadrez estudantil, universitário e estadual de Rápido