“A extrema direita brasileira, aliada ao trumpismo, revela sua fraqueza ao atacar a democracia que finge defender”, aponta o sociólogo Boaventura de Sousa Santos
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O futuro da democracia brasileira voltou a brilhar, apesar das nuvens no horizonte. As principais razões são as seguintes. O presidente da República do Brasil, Lula da Silva, é hoje o líder mais respeitado e admirado do mundo. Falam por si sua longa trajetória política e o sofrimento injusto a que foi submetido por uma conspiração de lawfare, articulada entre forças político-jurídicas nacionais e estrangeiras, que o levaram à prisão durante 532 dias. Essas forças, frustradas por não terem conseguido eliminar sua presença política, ainda tentaram, em 8 de janeiro de 2023, impedir que assumisse o cargo para o qual foi democraticamente eleito.
A estatura política de Lula da Silva agiganta-se hoje ainda por outro motivo. É próprio das democracias que os governantes eleitos tenham de conviver com uma oposição parlamentar. Por vezes, com duas oposições: uma parlamentar e outra extraparlamentar. Acontece que o presidente Lula da Silva é, talvez, hoje o único governante democraticamente eleito que tem de conviver com três oposições: a oposição parlamentar; a oposição dentro do seu próprio governo — uma vez que se trata de um governo de composição interpartidária e que, por isso, inclui ministros que militaram ativamente nas várias tentativas de pôr fim à sua carreira política —; e uma terceira oposição, expatriada, autoexilada na incubadora do movimento global de extrema direita em que se transformou Washington.
Essa terceira oposição, escandalosamente liderada por um deputado brasileiro, Eduardo Bolsonaro, constitui hoje, de fato, uma segunda embaixada do Brasil em Washington. Essa embaixada está tão obsessivamente empenhada em subverter a democracia brasileira e em ressuscitar golpistas defuntos que não hesita em promover danos gravíssimos à economia brasileira e ao bem-estar do povo brasileiro — inclusive daqueles que, no passado, votaram em seus comparsas no governo anterior. Estes, segundo a Organização Mundial da Saúde, foram responsáveis, só no primeiro ano da pandemia (de março de 2020 a março de 2021), por 120 mil mortes que poderiam ter sido evitadas se o Brasil tivesse adotado medidas preventivas, como distanciamento social e restrições a aglomerações.
Essa terceira oposição é um caso inédito na história moderna das democracias. Representa uma manifestação extrema — e extremamente contraditória — de força e de fraqueza. De força, porque esses opositores se orgulham de estar por trás da agressão tarifária promovida por Donald Trump, o mestre do golpismo internacional, do qual os embaixadores (mais corretamente, rebaixadores) da extrema direita são meros mordomos de baixo escalão. Orgulham-se também de ter engendrado o mais grotesco e soez ataque a um sistema judiciário estrangeiro de que se tem memória, dirigido ao ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes — um dos mais notáveis magistrados do nosso tempo. Moraes, ao lado de Baltasar Garzón (Espanha), Raul Zaffaroni (Argentina e Corte Interamericana de Direitos Humanos), Albie Sachs (África do Sul pós-apartheid), Ruth Bader Ginsburg (EUA) e N.V. Ramana (Índia), compõe hoje o quadro do que deve ser uma magistratura independente, comprometida com a salvaguarda e o aprofundamento da democracia.
Mas, ao manifestar toda essa força, essa oposição expatriada — e, com ela, toda a direita e a extrema direita que nela se revê — revelou, contraditoriamente, toda a sua desarmante fraqueza. Precisou se abrigar à sombra de um gigante de palha — por natureza e por interesse próprio, também um incendiário suicida — para desferir contra o Brasil e os brasileiros o mais duro golpe que se pode imaginar. Ousou sacrificar o próprio país para sobreviver em sua mesquinha pequenez. Foi um estrondoso tiro no pé que a manterá manca por muitos anos.
É por essas razões que o patriotismo no Brasil é hoje, mais do que nunca, democrático e de esquerda. Os fascistas e golpistas que se embrulham na bandeira verde e amarela sujam-na com sangue e ignomínia. É fundamental que os democratas de esquerda tenham plena consciência disso, do dano que essa quinta-coluna está causando ao país — e que tornem esse perigo amplamente conhecido. É crucial que se mobilizem para assumir com orgulho o patriotismo: um sentimento construtivo de defesa da soberania e da democracia brasileiras. Um sentimento que nada tem a ver com os propagandistas nacionalistas que, como se tem visto, acabam sempre por revelar sua verdadeira natureza: são vende-pátrias.
Boaventura de Sousa Santos é sociólogo e escritor
Ver comentários (1)
Bom dia!
Boaventura resumiu com maestria o atual momento politico que vivemos, momento que vem sendo construindo a tempos desde que a direita percebeu não ter chance e nem competência de mostrar serviço quando chegam ao poder. Se espelham no modelo neoliberal baseado no entreguísmo e submissão. Vão perder novamente porque os brasileiros verdadeiros patriotas não darão as eles a oportunidade para apunhalarem nosso País e nossa democracia. Parabéns !!!!