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“O bordado da gentileza”

Ainda que não mais seja
Tuty Osório é jornalista e escritora

“O contraste da moça sonolenta com o rapaz do saguão é evidente e expressivo de que considerar o outro faz bem para a saúde”, aponta a jornalista e publicitária Tuty Osório.

Confira:

Engato a correria da conexão em Guarulhos, sempre uma marcha dura porque as distâncias são enormes e quando se tem pressa não há como curtir a quantidade imensa de lojinhas e quiosques, tudo lindo, convidando ao consumo. Eu esbaforida, buscando o portão do embarque seguinte. O primeiro trecho cumprido durante a madrugada, aproveitando o voo para redigir um trabalho importantíssimo, prioritário.

Alcançado o portão da vez, encontro uma cadeira livre e retomo ao meu companheiro notebook. Tenho meia hora e aos poucos vou reelaborando o texto, cumprindo o compromisso abraçado com o rigor, a qualidade, a responsabilidade que me premiam e me protegem. Amo muito o meu trabalho e até com sacrifício não consigo executá-lo sem prazer. Move-me o sentido e a utilidade de interpretar opiniões à luz de bons objetivos.

O rapaz ao meu lado pede um papel para ajudar a senhora em pé que derramou o café sobre o balcão da companhia aérea. Quando vou procurar ela já resolveu e comento que além do incômodo é o desperdício de perder um café quentinho, às 6 da manhã. Abri mão do meu pra não gastar o tempo precioso das minhas tarefas. O rapaz oferece-se para ir buscar e fico comovida. Declino, agradecendo muito, tomarei no avião.

Na aeronave prossigo no teclado até a poltrona da frente se inclinar sobre a mesinha onde pouso o computador. Nunca faço isso sem verificar se vou prejudicar a vizinhança. O contraste da moça sonolenta com o rapaz do saguão é evidente e expressivo de que considerar o outro faz bem para a saúde. Consolo-me na elegância solidária e desço em Cuiabá com meu dever cumprido, digitado em posição mirabolante, porém, concluído. A revisão atenta confirma que está tudo certo, como deve estar.

Preparo-me para o próximo round. Desafio superado, consigo descansar depois de mais de 24 horas no ar, sem sono e sem jantar. Não sem antes gatafunhar este relato literalmente irado de uma noite e um dia de aventuras existenciais. Sou uma sujeita de sorte.

Tuty Osório é jornalista, publicitária, especialista em pesquisa qualitativa e escritora. Lançou em 2022, QUANDO FEVEREIRO CHEGOU (contos); em 2023, MEMÓRIAS SENTIMENTAIS DE MARIA AGUDA (10 crônicas, um conto e um ponto) e SÔNIA VALÉRIA A CABULOSA (quadrinhos com desenhos de Manu Coelho); todos em ebook, disponíveis, em breve, na PLATAFORMA FORA DE SÉRIE PERCURSOS CULTURAIS

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