“enquanto muitos estão dispostos a colaborar para mitigar os efeitos da tragédia, outros agem de má-fé, ao gerar e difundir conteúdos falsos”, aponta o jornalista Marcos Robério Santo. Confira:
Desastres como o que ocorre atualmente no Rio Grande do Sul são cada vez menos “naturais”. Como qualquer pessoa minimamente informada e intelectualmente honesta sabe, fenômenos climáticos extremos têm se tornado mais frequentes devido à ação humana. Nossa negligência ou pouca eficiência em lidar com questões como o aquecimento global têm cobrado um preço alto, como mostram inúmeros episódios recentes, marcados por destruição e mortes. Isso não vem de hoje. O problema é que, agora, além do trabalho hercúleo que tragédias como essa demandam, a propagação de informações falsas tem se tornado uma barreira a mais no enfrentamento das crises.
Em seu livro “O futuro de uma ilusão”, Freud diz que uma das poucas impressões agradáveis e edificantes que se pode ter da humanidade se dá quando, “diante de uma catástrofe natural, ela esquece as dimensões da cultura, todas a dificuldades e hostilidades internas, e se recorda da grande tarefa comum de sua conservação diante da prepotência da natureza”.
Isso, em certa medida, continua sendo válido. Basta ver as emocionantes cenas de resgates realizados pelas equipes especializadas e por pessoas comuns, que não medem esforços para salvar vidas e ajudar a quem precisa, das mais diversas formas. Junta-se a isso a grande onda de solidariedade promovida pela sociedade em geral, artistas, influenciadores, governos, entidades e vários outros grupos, em forma de doações em dinheiro ou de arrecadação e envio de materiais de primeira necessidade, entre outros.
Entretanto, enquanto muitos estão dispostos a colaborar para mitigar os efeitos da tragédia, outros agem de má-fé, ao gerar e difundir conteúdos falsos, que têm o poder de confundir a população e aumentar a sensação de pânico, em meio a uma situação já bastante penosa. Assim, além de se ocupar com todas as típicas condições adversas que episódios de desastre impõem, autoridades, veículos de imprensa e outros atores sociais vivem agora uma realidade na qual precisam, de forma recorrente, verificar e desmentir informações propositadamente erradas. Tempo precioso que poderia ser empregado em ações mais urgentes.
Entre as mentiras disseminadas sobre a crise no RS em mídias sociais e grupos de mensagens estão: que impostos estariam sendo cobrados sobre as doações; que estaria havendo ações de fiscalização para barrar as entregas de material arrecadado; que veículos de apoio utilizados nos salvamentos estariam sendo multados; que, em determinado município gaúcho, doações às vítimas das enchentes estariam sendo retidas para aguardar a chegada do presidente Lula; que havia mais de 300 mortos no município de Canoas; que o governo federal havia patrocinado o show da Madonna, no Rio de Janeiro, ocorrido enquanto se dava o drama gaúcho. Todas essas informações são falsas.
Tanto a Polícia Federal como a Polícia Civil do Rio Grande do Sul abriram investigações para apurar a divulgação de fake news. Espera-se que os responsáveis sejam identificados, julgados e devidamente punidos.
Nos últimos anos, a desinformação deliberada tornou-se uma das armas preferidas de grupos que atuam no submundo da política. É a prática típica do bolsonarismo (mas não apenas), que vive de fomentar o caos por meio de narrativas estapafúrdias e que está entranhado na sociedade brasileira. Ver esse tipo de expediente ser utilizado em momento tão triste e desafiador como o atual é ainda mais revoltante.
O cenário, ao contrário, pede responsabilidade, sobriedade, agilidade e união de esforços, tanto de governos como da sociedade, a fim de salvar vidas, amenizar o sofrimento e, em seguida, reerguer as pessoas e o estado.
Marcos Robério Santo é jornalista
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