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“O Homem Mau Dorme Bem”

Walter Filho é promotor de justiça do Ceará. Foto: Arquivo Pessoal.

Com o título “O Homem Mau Dorme Bem”, eis artigo de Walter Filho, promotor de justiça do Estado do Ceará. “O medo de ser vítima de assaltos, sequestros ou outros tipos de violência rouba algo precioso: a paz de espírito. Nos sentimos desamparados, como se a responsabilidade pela segurança estivesse apenas em nossas mãos; enquanto o Estado, que deveria agir, é por demais incompetente”, expõe o articulista.

Confira:

Um paradoxo inquietante emerge da criminalidade: enquanto o homem mau, aquele que comete atos perversos e desumanos, parece dormir tranquilamente, os cidadãos sitiados e angustiados pelo medo, mal conseguem momentos de tranquilidade. Esta inversão moral, onde o criminoso desfruta de noites sem remorso, reflete uma das facetas mais perturbadoras da realidade brasileira – a insegurança que nos rodeia.

Um vetor relevante para o quadro atual é a falta de punição severa – o resto é conversa distorcida de quem não quer enxergar a realidade. A percepção de que o sistema de Justiça é lento alimenta a audácia dos criminosos. Muitos sabem que, mesmo sendo capturados, há grandes chances de enfrentarem penas leves, regalias dentro do sistema prisional ou até a possibilidade de não serem punidos.

A corrupção enraizada no sistema legal, onde figuras públicas roubam e desfrutam de bens luxuosos é espelho para celerados agirem confiantes na impunidade. É o império da gatunagem graúda, que tem dado muito trabalho aos agentes federais, estes fazem um esforço supremo para desmanchar as quadrilhas que lucram com desvios de verbas públicas.

A necessidade de reforçar trancas, instalar câmeras de segurança, evitar sair à noite e até mudar rotinas demonstra como a criminalidade influencia o comportamento cotidiano. Esta tensão contínua afeta a qualidade de vida e a saúde mental, levando a quadros de insônia, ansiedade e depressão – maiormente os que sofreram na pele a crueldade dos facínoras. Infelizmente, para muitos um pesadelo que se estende para além das ruas.

O medo de ser vítima de assaltos, sequestros ou outros tipos de violência rouba algo precioso: a paz de espírito. Nos sentimos desamparados, como se a responsabilidade pela segurança estivesse apenas em nossas mãos; enquanto o Estado, que deveria agir, é por demais incompetente. Estamos fazendo muito pouco diante dos números assustadores. Em números absolutos, o Brasil é campeão em assassinatos e figura entre os países com os mais altos índices de violência no mundo.

No Ceará, foram registrados mais de 3.100 homicídios no ano de 2024. Um turista foi morto em Jericoacoara por fazer um simples gesto e divulgar fotos em Redes Sociais –arrastado e torturado por membros de uma facção criminosa. No Rio de Janeiro, que dizem ser a Cidade Maravilhosa, você pode ser vítima de uma bala perdida ou fuzilado porque o carro entrou na comunidade sem baixar os vidros. Em São Paulo, celulares são tomados em plena luz do dia. A imprensa divulga diariamente cenas de violência.

O Brasil vive um dilema moral e social que há muito deixou de ser enfrentado, talvez seja tarde demais para mudarmos esta face cruel. Existem muitos agentes de segurança, magistrados e promotores enfrentando este quadro sangrento, mas sem uma união nacional de forças e legislação dura não iremos triunfar. Afinal, uma nação que não consegue dormir com um mínimo de paz, dificilmente despertará para o progresso.

*Walter Filho

Promotor de justiça do Estdao do Ceará.

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Respostas de 3

  1. Meu caro amigo Walter, seu artigo merece comentários que levariam páginas e mais páginas de ideias, pontos de vistas e fatos que permeiam o tema. Vou me ater apenas a um detalhe: “investimentos em segurança”.
    O Brasil pode comemorar! Se existe um “setor” que cresce à velocidade da luz, honrando-nos uma posição relevante, é a criminalidade. Cidades brasileiras já não dormem um sono sossegado, com destaque para Feira de Santana, na Bahia, que figurou entre as 20 cidades mais violentas do mundo. Um dos motivos para tão glorioso posto deve-se ao ínfimo valor investido em segurança pública no Brasil. No ano de 2024, o Governo Federal investiu 1,536 bilhões de Reais no Programa de Prevenção e Enfrentamento da Criminalidade, quantia equivalente a menos da metade do que gastou com viagens e diárias, em 2023, sendo o valor de 3,3 bilhões de Reais.
    Por outro lado, o que se mostra alarmante é o crescimento vertiginoso do setor de segurança privada que, no ano de 2024, movimentou 170 bilhões de reais, com destaque aos 1,7% do PIB. Sem dúvidas, a segurança privada cresceu em detrimento ao sucateamento da segurança pública. Assim sendo, tira-nos também o sono, deixando-nos bastante preocupados, pois, caso a segurança pública venha a ganhar destaque, com atuação exitosa, automaticamente comprometerá os resultados da segurança privada, que, com certeza, promoverá desemprego, dívidas e falências. Enfim, já não durmo bem há muito tempo.
    Eliezer Feitosa
    Empresário

  2. Parabéns ao Promotor Walter Filho pelo brilhante e contundente artigo! Sua análise traduz, de forma precisa e corajosa, uma realidade que muitos preferem ignorar. A inversão moral que coloca cidadãos de bem reféns do medo, enquanto criminosos parecem viver sem remorso, é uma das facetas mais perturbadoras da nossa sociedade. A crítica à impunidade e à corrupção, aliada à reflexão sobre a precariedade da segurança pública, é uma verdadeira chamada à ação. Seu texto nos desafia a repensar não apenas nossas políticas públicas, mas também nosso papel como sociedade na luta por justiça e segurança. É urgente que enfrentemos essa crise com união, seriedade e firmeza, sob pena de perdermos, de vez, nossa paz e dignidade. Mais uma vez, parabéns pela clareza, profundidade e relevância de suas palavras.

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