“Reuniões informais, sombras de conluio e a erosão da confiança pública colocam em xeque a postura de ministros do STF”, aponta a jornalista Denise Assis
Confira:
Existem atitudes tomadas por parte de certas autoridades, no Brasil, que contaminam o ambiente político. Soam a promiscuidade, conluio, acordo, ou qualquer outro nome que se queira dar.
Sim, estou falando das falácias em torno de reuniões entre Ciro, Rueda, Paulinho da Força e Michel — sempre ele —, com ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). E onde há sombras, dúvidas e controvérsias, podem procurar que lá estará Michel, a contorcer suas mãozinhas moles, na torcida pelo lado obscuro. E não foi diferente desta vez.
Infelizmente, o ministro Alexandre de Moraes, o último bastião de nossa esperança, foi indicado por ele, Michel, depois de ter recuperado, em quinze minutos, na condição de secretário de Segurança do Estado de São Paulo, o celular perdido da madame Temer, onde estavam arquivados fatos e fotos que poderiam comprometer — sabe-se lá se a imagem dele, dela ou dos dois concomitantemente —, ou de um estado inteiro. Ou seria da República? Fato é que, sentindo-se devedor da indicação, todas as vezes que Michel bate à sua porta, Moraes o recebe. (Aliás, bendito roubo ou sumiço de celular. Pariu o ministro que nos garantiu a democracia).
Para o bem da lisura, pela gravidade do que se passou no cenário político brasileiro, em que o Estado foi alvo de uma tentativa malograda de golpe, o mais sensato — não está escrito isto em lugar nenhum, apenas no código do bom senso — seria que, enquanto estivesse em curso o processo dos envolvidos no gravíssimo episódio, ministros do STF se recolhessem, evitassem contato com pautas que digam respeito ao tema — atendo-se apenas às referentes a outros julgamentos em que tivessem que atuar — e, de preferência, evitassem receber congressistas e lobistas, quanto mais os envolvidos em projetos afeitos ao assunto que estão julgando.
Eu nem sequer vou me pronunciar aqui sobre voos e caronas que extrapolaram tanto as regras da boa conduta que repisar o feito seria chutar cachorro morto (ou agonizante). O que ecoa, neste momento, são os “ohs!” de perplexidade, ao vir a público uma descrição bem formulada e bem redigida de um trança-trança acontecido na Praça dos Três Poderes, dias antes de ir a plenário com acachapante vitória: a descrição de um certo “acordo” entre congressistas, ministros do Supremo e ele — sempre ele —, Michel, para a aprovação da infame “dosimetria”.
Michel funciona como uma espécie de “abre-te sésamo” quando se trata de alcançar o gabinete do ministro Alexandre de Moraes. Em estando lá, todas as ilações são possíveis. Quem vai atestar ou desmentir o que foi tratado entre quatro paredes? A parte interessada, Michel, vai fechar-se em copas, com um sorrisinho zombeteiro, deleitando-se com mais essa desordem na vida política do país. Moraes fecha a toga, a boca e se mantém esfinge, depois do estrago feito. Gilmar Mendes, outro visitado, também se confere ares de superioridade, como quem não se passa para “fofocas”. E assim, o estrago está feito. Lançou-se uma nuvem cinza sobre o que de fato aconteceu em Brasília na aprovação indecente da tal “dosimetria”.
O resultado é a instabilidade, a suspeição e a incerteza. O melhor seria que as excelências do STF sossegassem o facho até a conclusão dessa peleja, conscientes de que o golpe, se foi tentado e malogrou, deu origem a uma série de outros microgolpes continuados. Portanto, ciladas vêm de todos os lados. Não dá para chorar depois sobre o cafezinho derramado. Juízo, senhores.
Denise Assis é jornalista e mestra em Comunicação pela UFJF. Trabalhou nos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Ex-assessora da presidência do BNDES, pesquisadora da Comissão Nacional da Verdade e CEV-Rio, autora de “Propaganda e cinema a serviço do golpe – 1962/1964” , “Imaculada” e “Claudio Guerra: Matar e Queimar”