Com o título “Último desejo”, eis um conto de Francisco Caminha, escritor e ex-deputado estadual.
Confira:
No leito do hospital ele fixou os olhos em mim e num gesto de súplica implorou assim: um cigarro, um cigarro, um cigarro. O idoso estava magérrimo em estado terminal da doença. Fui conversar com a enfermeira de plantão quando ela me avisou que ele só estava em cuidados paliativos e seu fim estava próximo. Era morador de rua, não tinha familiares e como eu realizava trabalhos sociais consegui o seu internamento. Na madrugada seguinte ele faleceu.
Ocorreu em mim um sentimento de culpa por não ter atendido seu último desejo. Seu corpo rogava por nicotina e aquele cigarro seria o último prazer daquele mendigo e eu negara seu último desejo.
Minha mãe tinha me ensinado a enxergar cada pessoa como se fosse um Cristo, especialmente, o mais pobres para os quais ela dedicou toda sua vida. Eu me lembrei que os soldados romanos negaram a Jesus seu último desejo. O mestre assim disse: Tenho sede e colocaram na sua boca uma esponja com vinagre.
Na minha mente eu tinha negado a Cristo e o vinagre teria sido minha indiferença. Por isso, o sentimento de culpa nutrido pela minha religiosidade da época me acusara na consciência.
Até aos condenados à pena de morte é permitido atender seu ultimo pedido. A tradição começou no final da idade média. Havia a superstição que oferecer algum prazer ao condenado evitaria que a alma do falecido não viesse assombrar os algozes. Até hoje, nos Estados Unidos da América o apenado à morte tem o direito de escolher o que comer como sua última refeição.
Recentemente faleceu um tio nosso. Ele tinha tinha 89 anos e há seis meses atrás pagou R$ 350.000,00 num carro elétrico quando já tinha um Corola com um ano de uso. Indaguei porque ele tinha trocado de carro já que não precisava. Ele disse: não tenho muito tempo mais, quis me dar esse prazer.
O avô de um amigo de 90 anos, também, já muito doente, rogou a ele:
- Meu filho eu não tenho muito tempo mais, vá na beira-mar, contrate uma menina bonita de peitinhos duros e me traga.
- Mas, papai, o senhor tem 90 anos está doente, não faz mais nada, o que o senhor quer com essa garota?
- Só que ela deite nua do meu lado. Eu quero ter o prazer de só segurar aqueles seios durinhos e nada mais.
Jamais negue o último desejo de alguém, senão a alma dele volta para te assombrar.
*Francisco Caminha
Escritor e ex-deputado estadual.